
“Nada te turbe, nada te espante. Tudo se pasa. Dios no se muda. La paciencia todo lo alcanza. Quien a Dios tiene nada le falta. Sólo Dios basta!”
“Nada te turbe. Nada te espante. Tudo passa. Deus não muda. A paciência tudo alcança. Quem a Deus tem, nada lhe falta. Só Deus basta!
______________________________________________________________________________________________
Oração da alma enamorada
SÃO JOÃO DA CRUZ
Senhor Deus, amado meu!
Se ainda Te recordas dos meus pecados,
para não fazeres o que ando pedindo,
faz neles, Deus meu, a tua vontade,
pois é o que mais quero,
e exerce neles a tua bondade e misericórdia
e serás neles conhecido.
E, se esperas por obras minhas,
para, por meio delas, me concederes o que te rogo,
dá-as Tu, e opera-as Tu por mim,
assim como as penas que quiseres aceitar
e faça-se.
Mas se pelas minhas obras não esperas,
porque esperas, clementíssimo Senhor meu?
Porque tardas?
Porque, se, enfim,
há-de ser graça e misericórdia
o que em teu Filho te peço,
toma a minha insignificância,
pois a queres,
e dá-me este bem,
pois que Tu também o queres.
Quem se poderá libertar dos modos
e termos baixos
se não o levantas Tu a Ti em pureza de amor,
Deus meu?
Como se levantará a Ti o homem
gerado e criado em baixezas,
se não o levantas Tu, Senhor,
com a mão com que o fizeste?
Não me tirarás, Deus meu,
o que uma vez me deste
em teu único Filho Jesus Cristo,
em quem me deste tudo quanto quero.
Por isso folgarei pois não tardarás,
se eu espero.
Com que dilações esperas,
pois, se desde já podes amar a Deus
em teu coração?
Meus são os céus e minha é a terra;
minhas são as gentes,
os justos são meus, e meus os pecadores;
os anjos são meus
e a Mãe de Deus
e todas as coisas são minhas;
e o mesmo Deus é meu e para mim,
porque Cristo é meu e todo para mim.
Que pedes pois e buscas, alma minha?
Tudo isto é teu e tudo para ti.
Não te rebaixes
nem repares nas migalhas
que caem da mesa de teu Pai.
Sai para fora de ti e gloria-te da tua glória,
esconde-te nela e goza,
e alcançarás as petições do teu coração.
Ditos de Luz I, 25-27
S. João da Cruz in As mais belas páginas de S. João da Cruz p. 176,177
Fonte: Ordem dos Padres Carmelitas – Carmelo Teresiano (OCD)-Portugal
……………………………………
Fonte: Obras Completas – Poesias V,VIII, II – Santa Teresa de Jesus (Edições Loyola, 2002).
V
“FELIZ O QUE AMA A DEUS”
Ditoso o coração enamorado
Que só em Deus coloca o pensamento;
Por Ele renuncia a todo o criado,
Nele acha glória, paz, contentamento.
Vive até de si mesmo descuidado,
Pois no seu Deus traz todo o seu intento.
E assim transpõe sereno e jubiloso
As ondas deste mar tempestuoso.
VIII
BUSCANDO A DEUS
Alma, buscar-te-ás em Mim.
E a Mim buscar-me-ás em ti.
De tal sorte pôde o amor,
Alma, em mim te retratar,
Que nenhum sábio pintor
Soubera com tal primor
Tua imagem estampar.
Foste por amor criada,
Bonita e formosa, e assim
Em meu coração pintada,
Se te perderes, amada,
Alma, buscar-te-ás em Mim.
Porque sei que te acharás
Em meu peito retratada,
Tão ao vivo debuxada*,
Que, em te olhando, folgarás
Vendo-te tão bem pintada.
E se acaso não souberes
Em que lugar me escondi,
Não busques aqui e ali,
Mas , se me encontrar quiseres,
A Mim, buscar-me-ás em ti.
Sim, porque és meu aposento,
És minha casa e morada;
E assim chamo, no momento
Em que de teu pensamento
Encontro a porta cerrada.
Busca-me em ti, não por fora…
Para me achares ali,
Chama-me, que, a qualquer hora,
A ti virei sem demora,
E a Mim buscar-me-ás em ti.
*Debuxada: esboçada. Uso de sinônimo, por desconhecimento do seu significado na tradução para a língua portuguesa.
II
NAS MÃOS DE DEUS
Sou vossa, sois o meu Fim:
Que mandais fazer de mim?
Soberana Majestade
E Sabedoria Eterna,
Caridade a mim tão terna,
Deus uno, suma Bondade,
Olhai que a minha ruindade,
Toda amor, vos canta assim:
Que mandais fazer de mim?
Vossa sou, pois me criastes,
Vossa, porque me remistes,
Vossa, porque me atraístes
E porque me suportastes;
Vossa, porque me esperastes
E me salvastes, por fim:
Que mandais fazer de mim?
Que mandais, pois, bom Senhor,
Que faça tão vil criado?
Qual o ofício que haveis dado
A este escravo pecador?
Amor doce, doce Amor,
Vede-me aqui, fraca e ruim:
Que mandais fazer de mim?
Eis aqui meu coração:
Deponho-o na vossa palma;
Minhas entranhas, minha alma,
Meu corpo, vida e afeição.
Doce Esposo e Redenção,
A vós entregar-me vim:
Que mandais fazer de mim?
______________________________________________________________________________________________
Fonte: Carmelo São José – Cruz Alta.
A série abaixo, de poemas carmelitanos , foi extraída da seção “POESIAS”, em sua íntegra, tendo sido publicados no site http://www.carmelosaojose.com.br/poesias.php.
SANTA TERESA DE JESUS
Morro por que não morro
Vivo sem viver em mim,
E tão alta vida espero,
Que morro porque não morro.
Vivo já fora de mim,
Desde que morro d’Amor
Porque vivo no Senhor
Que me escolheu para Si;
Quando o coração Lhe dei
Com terno amor lhe gravei:
Que morro porque não morro.
Esta divina prisão
Do grande amor em que vivo,
Fez a Deus ser meu cativo,
E livre o meu coração;
E causa em mim tal paixão
Ser eu de Deus a prisão,
Que morro porque não morro.
Ai que longa é esta vida!
Que duros estes desterros!
Este cárcere, estes ferros
Onde a alma está metida.
Só de esperar a saída
Me causa dor tão sentida,
Que morro porque não morro.
Ai, que vida tão amarga
Por não gozar o Senhor!
Pois sendo doce o amor,
Não o é, a espera larga;
Tira-me, ó Deus, este fardo
Tão pesado e tão amargo,
Que morro porque não morro.
Só com esta confiança
Vivo porque hei de morrer.
Porque morrendo, o viver
Me assegura a esperança;
Morte do viver s’alcança;
Vem depressa em meu socorro,
Que morro porque não morro.
Olha que o amor é forte;
Vida, não sejas molesta,
Olha que apenas te resta
Para ganhar-te o perder-te;
Vem depressa doce morte
Acolhe-me em teu socorro
Que morro porque não morro.
Do alto, aquela vida
Que é a vida prometida,
Até que seja perdida
Não se tem, estando viva;
Morte não sejas esquiva;
Vem depressa em meu socorro,
Que morro porque não morro.
Vida, que possa eu dar
A meu Deus que vive em mim,
Se não é perder-te enfim,
Para melhor O gozar?
Morrendo O quero alcançar,
Pois nele está meu socorro
Que morro porque não morro.
Nas mãos de Deus
Sou vossa, sois o meu fim:
Que mandais fazer de mim?
Soberana Majestade
E Sabedoria Eterna,
Caridade a mim tão terna,
Deus uno, suma Bondade,
Olhai que a minha ruindade,
Toda amor, vos canta assim:
Que mandais fazer de mim?
Vossa sou, pois me criastes,
Vossa, porque me remistes,
Vossa, porque me atraístes
E porque me suportastes;
Vossa, porque me esperastes
E me salvastes, por fim:
Que mandais fazer de mim?
Que mandais, pois, bom Senhor,
Que faça tão vil criado?
Qual o ofício que haveis dado
E este escravo pecador?
Amor doce, doce Amor,
Vede-me aqui, fraca e ruim:
Que mandais fazer de mim?
Eis aqui meu coração:
Deponho-o na vossa palma;
Minhas entranhas, minha alma,
Meu corpo, vida e afeição.
Doce Esposo e Redenção,
A vós entregar-me vim:
Que mandais fazer de mim?
Morte dai-me, dai-me vida;
Saúde ou moléstia dai-me;
Honra ou desonra mandai-me;
Dai-me paz ou guerra e lida.
Seja eu fraca ou destemida,
A tudo direi que sim:
Que mandais fazer de mim?
Dai-me riqueza ou pobreza,
Exaltação ou labéu;
Dai-me alegria ou tristeza,
Dai-me inferno ou dai-me céu;
Doce vida, sol sem véu,
Pois me rendi toda, enfim:
Que mandais fazer de mim?
Se quereis, dai-me oração;
Se não, dai-me soledade;
Abundância e devoção,
Ou míngua e esterilidade.
Soberana Majestade,
A paz só encontro assim:
Que mandais fazer de mim?
Dai-me, pois, sabedoria,
Ou, por amor, ignorância;
Anos dai-me de abundância,
Ou de fome e carestia;
Dai-me treva ou claro dia,
Vicissitudes sem fim:
Que mandais fazer de mim?
Se me quereis descansado,
Por amor o quero estar;
Se me mandais trabalhar,
Morrer quero trabalhando.
Dizei: onde? Como? E quando?
Dizei, doce Amor, por fim:
Que mandais fazer de mim?
Dai-me Calvário ou Tabor
Deserto ou terra abundante;
Seja eu como Jô na dor,
Ou João sobre o peito amante;
Seja vinha luxuriante
Ou, se quereis, vinha ruim:
Que mandais fazer de mim?
Ou José encarcerado,
Ou José Senhor do Egito;
Ou David sofrendo, aflito,
Ou David já sublimado;
Ou Jonas ao mar lançado,
Ou Jonas salvo, por fim.
Que mandais fazer de mim?
Já calada, já falando,
Traga frutos ou não traga,
Veja eu na lei minha chaga,
Ou goze Evangelho brando;
Quer fruindo, quer penando,
Sede a minha vida, enfim!
Que mandais fazer de mim?
Pois sou vossa, e Vós meu fim:
Que mandais fazer de mim?
Sobre aquelas palavras: “Dilectus meus mihi”
Entreguei-me toda, e assim
Os corações se hão trocado:
Meu Amado é para mim,
E eu sou para meu Amado.
Quando o doce Caçador
Me atingiu com sua seta,
Nos meigos braços do Amor
Minh’alma aninhou-se, quieta.
E a vida em outra, seleta,
Totalmente se há trocado:
Meu Amado é para mim,
E eu sou para meu Amado.
Era aquela seta eleita
Ervada em sucos de amor,
E minha alma ficou feita
Uma com o seu Criador.
Já não quero eu outro amor,
Que a Deus me tenho entregado:
Meu Amado é para mim,
E eu sou para meu Amado.
Colóquio amoroso
Deus meu, se o amor que me tendes
É como o amor que vos tenho,
Dizei: por que me detenho?
Ou Vós, por que vos detendes?
– Alma, que queres de mim?
– Deus meu, não mais do que ver-vos.
– E tu temes? Como assim?
0 O que mais temo é perder-vos.
Uma alma em Deus escondida,
Que mais tem que desejar?
Senão sempre amar e amar,
E, no amor toda incendida,
Tornar-vos de novo a amar?
Oh! dai-me, Deus meu, carinho!
Oh! dai-me amor abrasado,
E eu farei um doce ninho
Onde for de vosso agrado.
Feliz o que ama a Deus
Ditoso o coração enamorado
Que só em Deus coloca o pensamento;
Por Ele renuncia a todo o criado,
Nele acha glória, paz, contentamento.
Vive até de si mesmo descuidado,
Pois no seu Deus traz todo o seu intento.
E assim transpõe sereno e jubiloso
As ondas deste mas tempestuoso.
Formosura de Deus
Formosura que excedeis
A todas as formosuras.
Sem magoar, dor fazeis
Como sem dor desfazeis
O amor das criaturas.
Oh! laço, que assim juntais
Duas coisas sem igual!
Não sei porque desatais
Pois atando força dais
A ter por bem o que é mal.
Vós juntais quem não tem ser
Com o ser que não acaba.
Sem acabar, acabais,
Sem ter que amar, Vós amais
E engrandeceis nosso nada.
Ais do Destino
Sem Ti como é triste,
Meu Deus, o viver!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Ai! Como na terra
Longa é nossa estrada!
É duro desterro,
Penosa morada;
Leva-me daqui,
Senhor de meu ser!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Ai! Mundo tão triste
Em que me perdi!
Pois a alma não vive
Se longe de ti.
Meu doce Tesouro,
Que amargo sofrer!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Ó morte benigna
Põe termo a meus males!
Só tu, com teus golpes
Tão doces, nos vales.
Que ventura, ó Amado,
Contigo viver!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
O amor que é mundano
Se apega a esta vida;
Mas o amor divino
À outra nos convida.
Sem Ti, Deus eterno,
Quem pode viver?
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
A vida terrena
É engano bem triste;
Vida verdadeira
Só no Céu existe.
Deus meu, lá, contigo,
Oh! dá-me viver!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Quem é que ante a morte,
Deus meu, teme, aflito,
Se alcança por ela
Um gozo infinito?
Oh! sim o de amar-te
Sem mais te perder!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Ai! Minha alma geme
Tristissimamente…
Quem de seu Amado
Pode estar ausente?
Acabe depressa
Tão duro sofrer!
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
O peixe colhido
No anzol fraudulento
Encontra na morte
O fim do tormento.
Ai! Gemo e definho,
Bem meu, sem te ver,
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Em vão te procuro,
Pois nunca te vejo;
Jamais alivias,
Senhor, meu desejo.
Ah! isto me inflama
E obriga a gemer:
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Ai! Quando a meu peito
Vens na Eucaristia,
Deus meu, logo temo
Perder-te algum dia;
Tal pena me aflige
E impele a dizer:
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Põe termo a estas penas,
Senhor, e retira
Do exílio esta serva
Que por Ti suspira.
Quebrados meus ferros,
Feliz irei ser.
Com ânsias de ver-te,
Desejo morrer!
Mas justo é que eu sofra
Por tantas ofensas,
E expie meus erros
E culpas imensas.
Ai! Logre meu pranto
Fazer-te entender
Que em ânsias te ver-te,
Desejo morrer!
Busca-te em Mim
Alma, procura-te em mim
E a mim busca-me em ti.
Tão fielmente pode o Amor
Alma, em Mim, te retratar
Que nenhum sábio pintor
Soubera com tal primor
Tua imagem figurar.
Foste, por amor, criada
Formosa, bela e assim
Dentro de Meu ser, pintada.
Se te perderes, minha amada,
Alma, procura-te em Mim.
Porque eu sei que te acharás
Em Meu peito retratada,
Tão ao vivo figurada
Que ao ver-te folgarás
Por te veres tão bem pintada.
E se acaso não souberes
Em que lugar Me perdi,
Não Andes daqui para ali
Porque se encontrar Me quiseres
A Mim, Me acharás em ti!
Em ti, que és meu aposento
És minha casa e morada.
Aí busco, cada momento,
Em que do teu pensamento
Encontro a porta fechada.
Só em ti há que buscar-Me,
Que de ti nunca fugi;
Nada mais do que chamar-Me
E logo irei, sem tardar-Me
E a Mim, me acharás, em ti!
NADA TE PERTURBE
Nada te perturbe,
Nada te espante,
Tudo passa,
Deus não muda,
A paciência tudo alcança;
Quem a Deus tem
Nada lhe falta:
Só Deus basta.
Eleva o pensamento,
Ao céu sobe,
Por nada te angusties,
Nada te perturbe.
A Jesus Cristo segue
Com peito grande,
E, venha o que vier,
Nada te espante.
Vês a glória do mundo?
É glória vã;
Nada tem de estável,
Tudo passa.
Aspira às coisas celestes,
Que sempre duram;
Fiel e rico em promessas,
Deus não muda.
Ama-O como merece,
Bondade imensa;
Mas não há amor fino
Sem a paciência.
Confiança e fé viva
Mantenha a alma,
Que quem crê e espera
Tudo alcança.
Do inferno acossado
Muito embora se veja,
Burlará os seus furores
Quem a Deus tem.
Advenham-lhe desamparos,
Cruzes, desgraças;
Sendo Deus o seu tesouro,
Nada lhe falta.
Ide, pois, bens do mundo,
Ide, ditas vãs;
Ainda que tudo perca,
Só Deus basta.
Para a Pátria
Vamos para o Céu tão belo,
Monjas do Carmelo!
Vamos mui mortificadas,
Humildes e desprezadas,
Sem no gozo por o anelo,
Monjas do Carmelo!
Eia! Ao voto de obediência,
Jamais haja resistência,
Que é nosso fim, nosso anelo,
Monjas do Carmelo!
A pobreza é a estrada real
Que o Imperador celestial
Trilhou com todo o desvelo,
Monjas do Carmelo!
Nunca nos deixe de amar
Nosso Deus, nem de chamar.
Sigamos o seu apelo,
Monjas do Carmelo!
De amor está se abrasando
O que nasceu tiritando,
– Homem de Deus, num só elo -,
Monjas do Carmelo!
Vamo-nos enriquecer
Onde jamais há de haver
Pobreza ou qualquer flagelo,
Monjas do Carmelo!
Do Pai Elias no bando,
Vamo-nos contrariando,
Com sua força e seu zelo,
Monjas do Carmelo!
Duplo espírito busquemos
Como Eliseu, e neguemos
Nosso querer, com desvelo,
Monjas do Carmelo!
Ao nascimento de Jesus
Ó pastores que velais,
A guardar vosso rebanho,
Eis que vos nasce um Cordeiro,
Filho de Deus soberano.
Vem pobre, vem desprezado,
Tratai logo de o guardar,
Porque o lobo o há de levar
Sem que o tenhamos gozado.
– Gil, dá-me aquele cajado,
Vou tê-lo nas mãos todo o ano,
Não se nos leve o Cordeiro:
Não Vês que é Deus Soberano?
Sinto-me todo aturdido
De gozo e pena. E pergunto:
– Se é Deus o que hoje é nascido,
Como pode ser defunto?
É que é homem e Deus, junto;
Governa o destino humano;
Olha que o nosso Cordeiro
Filho é de Deus Soberano.
Não sei para que é que o pedem,
Pois lhe dão depois tal guerra.
– Olha, Gil, melhor será
Que se torne à sua terra…
Mas se todo o bem encerra,
E apaga o pecado humano,
Já que é nascido, padeça
Este Deus tão Soberano
Pouco te dói sua pena!
Tanto é certo que esquecemos
O que os outros por nós sofrem,
Se proveito recebemos!
Não Vês que um dia o teremos
Pastor do gênero humano?
Contudo é coisa tremenda
Que morra Deus Soberano.
Ao nascimento de Jesus
Hoje nos vem redimir
Um Zagal, nosso parente,
Gil, que é Deus Onipotente.
– Por isso nos há tirado
Da prisão de Satanás;
Mas é parente de Brás
E de Menga e de Vicente:
Porque é Deus Onipotente!
– Pois se é Deus, como é vencido
E morre crucificado?
– Não vês que mata o pecado,
Padecendo, Ele, inocente?
Gil, é Deus Onipotente!
Palavra! Que o vi nascido;
E a Mãe é linda Zagala,
– Pois se é Deus, como há querido
Estar com tão pobre gente?
– Não vês que Ele é Onipotente?
Deixa-te dessas perguntas,
Trajemos já de o servir.
E pois à morte que ir,
Morramos também, Vicente,
Pois é Deus Onipotente.
Para a Natividade
Já Deus nos há dado
O amor: assim, pois,
Não há que temer,
Morramos os dois.
Seu Único Filho
O Pai nos envia:
Nasce hoje na lapa,
Da Virgem Maria.
O homem – que alegria!
É Deus: assim pois,
Não há que temer,
Morramos os dois.
– Olha vem, Vicente:
Que amor! E que brio!
Vem Deus, inocente,
A padecer frio;
Deixa o senhorio
Que tem; assim, pois,
Não há que temer,
Morramos os dois.
– Mas como, Pascoal,
Tem tanta franqueza,
Que veste saial,
Deixando riqueza?
Mais quer à pobreza!
Sigamo-lo pois:
Se já vem feito homem,
Morramos os dois.
Mas qual sua paga
Por tanta grandeza?
– Só grandes açoites
Com muita crueza.
– Que imensa tristeza
Teremos depois!
Ah! se isto é verdade,
Morramos os dois.
– Mas como se atrevem,
Sendo Onipotente?
– Será morto um dia
Por perversa gente.
– Se assim é, Vicente,
Furtemo-lo pois:
– Não vês que o deseja?
Morramos os dois!
Ao nascimento do Menino Jesus
Galego, quem chama aí fora?
– São Anjos, à luz da aurora.
– Grande rumor ouço ao longe
Que parece cantilena,
– Vamos ver, Brás, – que amanhece –
A Zagala tão serena.
– Galego, quem chama aí fora?
_ São Anjos, à luz da aurora.
Será do alcaide parente?
Ou quem é esta donzela?
– É filha do Eterno Padre
E reluz como uma estrela.
Galeno, quem chama aí fora?
– São Anjos, à luz da aurora.
À Circuncisão
Ele está sangrando,
Dominguinhos, eh!
E eu não sei por quê…
– Por que – te pergunto –
Deram tal castigo
A Deus inocente,
Se é tão nosso amigo?
– Quis ter-me consigo,
Eu não sei por quê…
Quis amar-me muito,
Dominguinhos, eh!
Mas logo em nascendo
Tem suplício tal?
– Sim, que está morrendo
Por dar fim ao mal.
Que grande Zagal
Será ele! Crê!
Dominguinhos, he!
Não vês que o coitado
É infante inocente?
– Assim mo hão contado
Brasinho e Vicente.
Não amá-lo a gente
É vileza até!
Dominguinhos, eh!
À Cruz
Gostosa quietação da minha vida,
Sê bem-vinda, cruz querida.
Ó bandeira que amparaste
O fraco e o fizeste forte!
Ó vida da nossa morte,
Quão bem a ressuscitaste!
O Leão de Judá domaste,
Pois por ti perdeu a vida.
Sê bem-vinda, cruz querida.
Quem não te ama vive atado
E da liberdade alheio;
Quem te abraça sem receio
Não toma caminho errado.
Oh! ditoso o teu reinado,
Onde o mal não tem cabida!
Sê bem-vinda, cruz querida.
Do cativeiro do inferno,
Ó cruz, foste a liberdade;
Aos males da humanidade
Deste o remédio mais terno.
Deu-nos, por ti, Deus Eterno
Alegria sem medida.
Sê bem-vinda, cruz querida.
A caminho da cruz
O consolo está, e a vida,
Só na cruz;
E ao Céu é a única senda
Que conduz.
Está na cruz o Senhor
De céus e terra,
E o gozar de minha paz
Em plena guerra.
Todos os males desterra
Do mundo, a cruz.
E ao Céu é a única senda
Que conduz.
Da cruz é que diz a Esposa
A seu Querido,
Que é a palmeira preciosa
Aonde há subido;
Cujo fruto lhe há sabido
Ao seu Jesus.
E ao Céu é a única senda
Que conduz.
A santa cruz é oliveira
Mui preciosa,
Seu óleo nos unge e inunda
De luz radiosa;
Ó minh’alma, pressurosa,
Abraça a cruz:
Pois ao Céu é a única senda
Que conduz.
É o madeiro verdejante
E desejado
Da Esposa, que à sua sombra
Se há sentado,
A gozar de seu Amado,
O Rei Jesus.
Pois ao Céu é a única senda
Que conduz.
A alma que a Deus totalmente
Está rendida,
Bem deveras deste mundo
Já desprendida,
Árvore de gozo e vida
É a santa Cruz,
E ao Céu é o doce caminho
Que conduz.
Desde que na Cruz foi posto
O Salvador,
Só na cruz se encontra glória,
Honra e louvor;
Vida e consolo na dor
Dá-nos a cruz,
E ao Céu é a estrada segura
Que conduz.
Abraços à cruz
Vamos para o Céu tão belo
Monjas do Carmelo.
Abracemos bem a Cruz
E sigamos a Jesus,
Que é nosso caminho e luz,
Fartura do nosso anelo,
Monjas da Carmelo.
Sereis livres de cuidados,
Desconsolo e mil enfados,
Se os três votos professados
Observardes com desvelo,
Monjas do Carmelo.
O voto da obediência,
Ainda que de alta ciência,
Só o quebra a resistência:
Aparte Deus tal flagelo,
Monjas do Carmelo!
A castidade guardai,
E só a Deus desejai;
E nele vos encerrai,
Sem do mundo
Ouvir o apelo,
Monjas do Carmelo.
Nosso voto de pobreza,
Se guardado com pureza,
Está cheio de riqueza
E nos abre o Céu tão belo,
Monjas do Carmelo.
Fazendo assim, venceremos
Tudo, e enfim descansaremos
No Criador, que, em seus extremos,
Fez a terra e o Céu tão belo,
Monjas do Carmelo.
À profissão de Isabel dos anjos
Seja meu gozo no pranto;
Sobressalto, meu repouso;
Meu sossego, doloroso;
Minha ventura, quebranto.
Nas borrascas, meu amor;
Meu regalo, o ser ferida;
Na morte encontre eu a vida;
Nos desprezos, meu favor;
Meus tesouros, na pobreza;
Meu triunfo, em pelejar;
Meu descanso, em trabalhar;
Meu consolo, na tristeza;
Na escuridão, minha luz;
Meu trono, em posto mesquinho;
O atalho de meu caminho,
Minha glória seja a cruz.
Seja-me honra o abatimento;
Minha palma, o padecer;
Nas mínguas, o meu crescer;
Nas perdas, o meu aumento;
Na fome, a minha fartura;
A esperança, no temor;
Meus regalos, no pavor;
E meus gostos, na amargura;
No ouvido, minha memória;
Meu trono na humilhação;
No opróbrio, minha opinião;
Na afronta, minha vitória;
Minha coroa, a humildade;
As penas, minha afeição;
Um cantinho, meu quinhão;
Meu apreço, a soledade;
Em Cristo, a minha confiança,
E d’Ele só meu sustento;
Seu langor seja-me alento;
Gozo, sua semelhança.
Nisto encontro fortaleza,
Encontro tranqüilidade;
Prova de minha verdade,
Penhor de minha firmeza.
Loas à cruz
Cruz, descanso da minha vida, Sede a bem aparecida.
Ó bandeira, em cujo amparo
O mais fraco será forte!
Ó vida da nossa morte,
Que bem a ressuscitasse!
Ao leão tu amansaste,
Pois por ti perdeu a vida.
Sede a bem aparecida.
Quem não vos ama está cativo
E alheio à liberdade;
Quem a vós quer chegar
Em nada deve ter desvio.
Ó ditoso poderio
Onde o mal não tem cabida!
Sede a bem aparecida.
Vós fostes a liberdade
Do nosso grão cativeiro;
Por vós se reparou meu mal
Com tão custoso remédio,
Para com Deus foste meio
De alegria conseguida.
Sede a bem aparecida.
….
SÃO JOÃO DA CRUZ
Cântico Espiritual Canções entre a Alma e o Esposo (Granada 1584-1586)
1. Onde é que te escondeste,
Amado, e me deixaste com gemido?
Como o cervo fugiste,
Havendo-me ferido;
Saí, por ti clamando, e eras já ido.
2. Pastores que subirdes
Além, pelas malhadas, ao Outeiro,
Se, porventura, virdes
Aquele a quem mais quero,
Dizei-lhe que adoeço, peno e morro.
3. Buscando meus amores,
Irei por estes montes i ribeiras;
Não colherei as flores,
Nem temerei as feras,
E passarei os fortes e fronteiras.
Pergunta às criaturas 4. Ó bosques e espessuras,
Plantados pela mão de meu amado!
Ó prado de verduras,
De flores esmaltado,
Dizei-me se por vós ele há passado!
Resposta das criaturas
5. Mil graças derramando,
Passou por estes soutos com presteza,
E, enquanto os ia olhando,
Só com sua figura
A todos revestiu de formosura.
Esposa
6. Quem poderá curar-me?
Acaba de entregar-te já deveras;
Não queiras enviar-me
Mais mensageiro algum,
Pois não sabem dizer-me o que desejo.
7. E todos quanto vagam,
De ti me vão mil graças relatando,
E todos mais me chagam;
E deixa-me morrendo
Um “não sei quê”, que ficam balbuciando.
8. Mas como perseveras,
Ó vida, não vivendo onde já vives?
Se fazem com que morras
As flechas que recebes
Daquilo que do Amado em ti concebes?
9. Por que, pois, hás chagado
Este meu coração, o não saraste?
E, já que mo hás roubado,
Por que assim o deixaste
E não tomas o roubo que roubaste?
10. Extingue os meus anseios,
Porque ninguém os pode desfazer;
E vejam-te meus olhos,
Pois deles és a luz,
E para ti somente os quero ter.
11. Mostra tua presença!
Mate-me a tua vista e formosura;
Olha que esta doença
De amor jamais se cura,
A não ser com a presença e com a figura.
12. Ó cristalina fonte,
Se nesses teus semblantes prateados
Formasses de repente
Os olhos desejados
Que tenho nas entranhas debuxados!
13. Aparta-os, meu Amado,
Que eu alço o vôo.
Esposo
Oh! Volve-te, columba,
Que o cervo vulnerado
No alto do outeiro assoma,
Ao sopro de teu vôo, e fresco toma.
Esposa
14. No Amado acho as montanhas,
Os vales solitários, numerosos,
As ilhas mais estranhas,
Os rios rumorosos,
E o sussurro dos ares amorosos;
15. A noite sossegada,
Quase aos levantes do raiar da aurora;
A música calada,
A solidão sonora,
A ceia que recreia e que enamora.
16. Caçai-nos as raposas,
Que está já toda em flor a nossa vinha;
Enquanto destas rosas
Faremos uma pinha;
E ninguém apareça na colina!
17. Detém-te, Aquilão morto!
Vem, Austro, que despertas os amores:
Aspira por meu horto,
E corram seus olores,
E o Amado pascerá por entre as flores.
18. Ó ninfas da Judéia,
Enquanto pelas flores e rosais
Vai recendendo o âmbar,
Ficai nos arrabaldes
E não ouseis tocar nossos umbrais.
19. Esconde-te, Querido!
Voltando tua face, olha as montanhas;
E não queiras dizê-lo,
Mas olha as companheiras
Da que vai pela ilhas mais estranhas.
Esposo
20. A vós, aves ligeiras,
Leões, cervos e gamos saltadores
Montes, vales, ribeiras,
Águas, ventos, ardores,
E, das noites, os medos veladores:
21. Pelas amenas liras
E cantos de sereias, vos conjuro
Que cessem vossas iras,
E não toqueis no muro,
Para a Esposa dormir sono seguro.
22. Entrou, enfim, a Esposa
No horto ameno por ela desejado;
E a seu sabor repousa,
O colo reclinado
Sobre os braços dulcíssimos do Amado.
23. Sob o pé da macieira,
Ali, comigo foste desposada;
Ali te dei a mão,
E foste renovada
Onde a primeira mãe foi violada.
Esposa
24. Nosso leito é florido,
De covas de leões entrelaçado,
Em púrpura estendido,
De paz edificado,
De mil escudos de ouro coroado.
25. Após tuas pisadas
Vão discorrendo as jovens no caminho,
Ao toque de centelha,
Ao temperado vinho,
Dando emissões de bálsamo divino.
26. Na interior adega
Do Amado meu, bebi; quando saía,
Por toda aquela várzea
Já nada mais sabia,
E o rebanho perdi que antes seguia.
27. Ali me abriu seu peito
E ciência me ensinou mui deleitosa;
E a ele, em dom perfeito,
Me dei, sem deixar coisa,
E então lhe prometi ser sua esposa.
28. Minha alma se há votado,
Com meu cabedal todo, a seu serviço;
Já não guardo mais gado,
Nem mais tenho outro ofício,
Que só amar é já meu exercício.
29. Se agora, em meio à praça,
Já for mais eu vista, nem achada,
Direis que me hei perdido,
E, andando enamorada,
Perdidiça, me fiz e fui ganhada.
30. De flores e esmeraldas,
Pelas frescas manhãs bem escolhidas,
Faremos as grinaldas
Em teu amor floridas,
E num cabelo meu entretecidas.
31. Só naquele cabelo
Que em meu colo a voar consideraste,
– Ao vê-lo no meu colo, –
Nele preso ficaste,
E num só de meus olhos te chagaste.
32. Quando tu me fitavas,
Teus olhos sua graça me infundiam;
E assim me sobre amavas,
E nisso mereciam
Meus olhos adorar o que em ti viam.
33. Não queiras desprezar-me,
Porque, se cor trigueira em mim achaste,
Já podes ver-me agora,
Pois, desde que me olhaste,
A graça e a formosura em mim deixaste.
34. Eis que a branca pombinha
Para a arca, com seu ramo, regressou;
E, feliz, a rolinha
O par tão desejado
Já nas ribeiras verdes encontrou.
35. Em solidão vivia,
Em solidão seu ninho há já construído;
E em solidão a guia,
A sós, o seu Querido,
Também na solidão, de amor ferido.
36. Gozemo-nos, Amado!
Vamo-nos ver em tua formosura,
No monte e na colina,
Onde brota a água pura;
Entremos mais adentro na espessura.
37. E, logo, as mais subidas
Cavernas que há na pedra, buscaremos;
Estão bem escondidas;
E juntos entraremos,
E das romãs o mosto sorveremos.
38. Ali me mostrarias
Aquilo que minha alma pretendia,
E logo me darias,
Ali, tu, vida minha,
Aquilo que me deste no outro dia.
39. E o aspirar da brisa,
Do doce rouxinol a voz amena,
O Souto e seu encanto,
Pela noite serena,
Com chama que consuma sem dar pena.
40. Ali ninguém olhava;
Aminadab tampouco aparecia;
O cerco sossegava;
Mesmo a cavalaria,
Só à vista das águas, já descia.
Noite Escura
Canções da alma que goza o ter chegado ao alto estado de perfeição, que é a união com Deus, pelo caminho da negação espiritual, ou seja, da noite escura da fé. (Segunda metade de 1578)
Canções da Alma
1. Em uma noite escura,
De amor em vivas ânsias inflamada,
Oh! Ditosa ventura!
Já minha casa estando sossegada.
2. Na escuridão, segura,
Pela secreta escada, disfarçada,
Oh! Ditosa ventura!
Na escuridão, velada,
Já minha casa estando sossegada.
3. Em noite tão ditosa,
E num segredo em que ninguém me via,
Nem eu olhava coisa,
Sem outra luz nem guia
Além da que no coração me ardia.
4. Essa luz me guiava,
Com mais clareza que a do meio-dia
Aonde me esperava
Quem eu bem conhecia,
Em sítio onde ninguém aparecia.
5. Oh! Noite que me guiaste,
Oh!, noite mais amável que a alvorada;
Oh! Noite que juntaste
Amado com amada,
Amada já no Amado transformada!
6. Em meu peito florido
Que, inteiro, para ele só guardava,
Quedou-se adormecido,
E eu, terna, o regalava,
E dos cedros o leque o refrescava.
7. Da ameia a brisa amena,
Quando eu os seus cabelos afagava,
Com sua mão serena
Em meu colo soprava,
E meus sentidos todos transportava.
8. Esquecida, quedei-me,
O rosto reclinado sobre o Amado;
Tudo cessou. Deixei-me,
Largando meu cuidado
Por entre as açucenas olvidado.
Chama viva de Amor
Canções da alma na íntima comunicação de união de amor com Deus. (Granada 1582-1584)
1. Oh! Chama de amor viva
Que ternamente feres
De minha alma no mais profundo centro!
Pois não és mais esquiva,
Acaba já, se queres,
Ah! Rompe a tela deste doce encontro.
2. Oh! Cautério suave!
Oh! Regalada chaga!
Oh! Branda mão! Oh! Toque delicado
Que a vida eterna sabe,
E paga toda dívida!
Matando, a morte em vida me hás trocado.
3. Oh! Lâmpadas de fogo
Em cujos resplendores
As profundas cavernas do sentido,
– Que estava escuro e cego –
Com estranhos primores
Calor e luz dão junto a seu Querido!
4. Oh! Quão manso e amoroso
Despertas em meu seio
Onde tu só secretamente moras:
Nesse aspirar gostoso,
De bens e glória cheio,
Quão delicadamente me enamoras!
Vivo sem viver em mim (Ávila 1572-1577(?))
Vivo sem viver em mim
E de tal maneira espero
Que morro porque não morro
1. Em mim eu não vivo já,
E sem Deus viver não posso;
Pois sem Ele e sem mim quedo,
Este viver que será?
Mil mortes se me fará,
Pois minha mesma vida espero,
Morrendo porque não morro.
2. Esta vida que aqui vivo
É privação de viver;
E assim, é contínuo morrer
Até que viva contigo.
Ouve, meu Deus, o que digo,
Que esta vida não a quero
Pois morro porque não morro.
3. Ausente estando eu de ti,
Que vida poderei ter
Senão morte padecer,
A maior que jamais vi?
Pena e dó tenho de mim,
Pois se assim eu persevero,
Morrerei porque não morro.
4. O peixe que da água sai
Nenhum alívio carece
Que na morte que padece,
Afinal a morte lhe vale.
Que morte haverá que se iguale
Ao meu viver lastimoso,
Pois se mais vivo, mais morro?
5. Quando penso aliviar-me
Vendo-te no Sacramento,
Faz-me em mim mais sentimento
De não poder-te gozar;
Tudo é para mais penar,
Por não ver-te como quero,
E morro porque não morro.
6. Se me deleito, Senhor,
Com a esperança de ver-te,
Vendo que posso perder-te
Redobra-se em mim a dor;
Vivendo em tanto temor
E esperando como espero,
Morro sim, porque não morro.
7. Livra-me já desta morte,
Meu Deus, entrega-me a vida;
Não ma tenhas impedida
Por este laço tão forte;
Olha que peno por ver-te,
O meu mal é tão inteiro,
Que morro porque não morro.
8. Chorarei já minha morte
Lamentarei minha vida,
Enquanto presa e retida
Por meus pecados está.
Oh! Meu Deus! Quando será
Que eu possa dizer deveras:
Vivo já porque não morro?
Poesia 7 (1582-1584)
1. Um Pastorinho, só, está penando,
Privado de prazer e de contento,
Posto na pastorinha o pensamento,
Seu peito de amor ferido, pranteando.
2. Não chora por tê-lo o amor chagado,
Que não lhe dói o ver-se assim dorido,
Embora o coração esteja ferido,
Mas chora por pensar que é olvidado.
3. Que só o pensar que está esquecido
Por sua bela pastora, é dor tamanha,
Que se deixa maltratar em terra estranha,
Seu peito por amor mui dolorido.
4. E disse o Pastorinho: Aí, desditado!
De quem do meu amor se faz ausente
E não quer gozar de mim presente!
Seu peito por amor tão magoado!
5. Passado tempo em árvore subido
Ali seus belos braços alargou,
E preso a eles o Pastor ali ficou,
Seu peito por amor mui dolorido.
Cantar da alma que se alegra em conhecer a Deus pela fé (Toledo, Cárcere – 1578)
Que bem sei eu a fonte que mana e corre mesmo de noite
1. Aquela eterna fonte está escondida,
mas bem sei onde tem sua guarida,
mesmo de noite.
2. Sua origem não a sei, pois não a tem,
Mas sei que toda a origem dela vem,
mesmo de noite.
3. Sei que não pode haver coisa tão bela,
E que os céus e a terra bebem dela,
mesmo de noite.
4. Eu sei que nela o fundo não se pode achar,
E que ninguém pode nela a vau passar,
mesmo de noite.
5. Sua claridade nunca é obscurecida,
e sei que toda a luz dela é nascida,
mesmo de noite.
6. Sei que tão caudalosas são suas correntes,
Que céus e infernos regam, e as gentes,
mesmo de noite.
7. A corrente que desta fonte vem
É forte e poderosa, eu sei-o bem,
mesmo de noite.
8. A correste que destas duas procede,
Sei que nenhuma delas a precede,
mesmo de noite.
9. Aquela eterna fonte está escondida
Neste pão vivo para dar-nos vida,
mesmo de noite.
10. De lá está chamando as criaturas,
Que nela se saciam às escuras,
mesmo de noite.
11. Aquela viva fonte que desejo,
Neste pão de vida já a vejo,
mesmo de noite.
POESIAS
ELISABETE DA TRINDADE
Elevação à Santíssima Trindade (21 de novembro de 1904)
Ó meu Deus, Trindade que adoro, ajudai-me a esquecer-me inteiramente de mim mesma para fixar-me em vós, imóvel e pacífica, como se minha alma já estivesse na eternidade. Que nada possa perturbar-me a paz nem me fazer sair de vós, ó meu Imutável, mas que em cada minuto eu me adentre mais na profundidade de vosso Mistério. Pacificai minha alma, fazei dela o vosso céu, vossa morada preferida e o lugar de vosso repouso. Que eu jamais vos deixe só, mas que aí esteja toda inteira, totalmente desperta em minha fé, toda em adoração, entregue inteiramente à vossa Ação criadora.
Ó meu Cristo amado, crucificado por amor; quisera ser uma esposa para vosso Coração, quisera cobrir-vos de glória, amar-vos… até morrer de amor! Sinto, porém, minha impotência e peço-vos revestir-me de vós mesmo, identificar a minha alma com todos os movimentos da vossa, submergir-me, invadir-me, substituir-vos a mim, para que minha vida seja uma verdadeira irradiação da vossa. Vinde a mim como Adorador, como Reparador e como Salvador. Ó Verbo eterno, Palavra de meu Deus, quero passar minha vida a escutar-vos, quero ser de uma docilidade absoluta para tudo aprender de vós. Depois, através de todas as noites, de todos os vazios, de todas as impotências, quero ter sempre os olhos fixos em vós e ficar sob vossa grande luz; ó meu astro Amado, fascinai-me a fim de que não me seja possível sair de vossa irradiação.
Ó Fogo devorador, Espírito de amor, “vinde a mim” para que se opere em minha alma como que uma encarnação do Verbo: que eu seja para ele uma humanidade de acréscimo na qual ele renove todo o seu Mistério. E vós, ó Pai, inclinai-vos sobre vossa pobre e pequena criatura, cobri-a com vossa sombra vendo nela só o Bem-Amado, no qual pusestes todas as vossas complacências.
Ó meu Três, meu Tudo, minha Beatitude, Solidão infinita, Imensidade onde me perco, entrego-me a vá qual uma presa. Sepultai-vos em mim para que eu me sepulte em vós, até que vá contemplar em vossa luz o abismo de vossas grandezas.
Sobre os atributos da Carmelita (15 de outubro de 1897)
Ó cara veste de burel,
Pobre e tão simples pano,
Apesar de tua fazenda dura,
Como me pareces bela!
Véu branco que me lembras
Uma aurora doce e bela,
O dia em que o doce Salvador
Tomou posse de meu coração.
Ó pobre e simples rosário,
A mais bela das jóias,
Dos terços o mais belo,
De muito te prefiro.
Com tua imensa cruz
E tuas pobres contas de madeira,
Quando serás meu ornamento
Não deixando nunca a minha cintura?
Ó vinde mortificar minha carne,
Vós já me sois caros,
Duros objetos de repugnância,
Para quem não ama o sofrimento.
E tu, pobre e caro anel,
Tu me pareces o selo
Das eternas promessas
Que fiz a meu Senhor,
Em minha santa e pura embriagues,
Dia de alegria e de dores.
Enfim, pequena cela,
Pobre quarto minúsculo,
Ó querida prancha de madeira,
Quando dormirei sobre ti.
Ó minha preciosa libré,
E vós todos, caros atributos,
Santa pobreza de Deus,
Ó feliz mosteiro,
Vós me pareceis sobre a Terra
Um cantinho dos Céus.
A Maria Imaculada (8 de dezembro de 1897)
Oh, guarda-me sempre casta e pura,
Preserva-me de toda a falta,
Vela com cuidado sobre meu fraco coração
Para que agrade ao Bem-Amado Salvador.
Que se pareça a um jardim solitário,
Que Jesus se agrade deste canteiro,
Que se digne visitá-lo muitas vezes,
Oh, que Ele aí permaneça constantemente,
Que Ele seja o Rei, o único apoio,
O Esposo enfim, o divino Amigo,
E que visitando-o a toda a hora
Nela faça a sua demora.
Porque meu coração está sempre com Ele,
E noite e dia pensa sem descaso
No Celeste e divino Amigo
A quem queria demonstrar sua ternura.
Também se eleva a Ele de desejo:
Não morrer, mas longamente sofrer,
Sofrer para Deus, dar-Lhe sua vida,
Rezando pelos pobres pecadores.
Oh, tal é minha santa inveja!
Da imortal e santa Pátria,
Virgem bendita, Ó doce Maria,
Tu velarás sobre meu débil coração.
Tu o guardarás sempre casto e puro
Preservando-o de toda a falta
A fim de que agrade a meu doce Salvador.
A Noite de Natal (25 de dezembro de 1897)
Ó doces sinos do Carmelo,
Voai alegremente ao Céu.
Nesta noite misteriosa,
Tão pura e tão deliciosa,
Gosto de ouvir vossos carrilhões,
No silêncio tão profundo
Da noite grande e solene,
Memorável e sempre tão bela
Enquanto que vós, ó carmelitas,
Almas escolhidas, almas de elite,
Vós orais junto ao senhor
Numa santa e bem doce felicidade,
Atrás de vossa espessa grade,
Ó santas almas, pobres moças.
Eu, eu também oro ao Senhor,
Dou-Lhe meu pobre coração
Peço-Lhe por partilha
Ser humilde e pobre à Sua imagem,
De tudo deixar por Ele,
A Ele para sempre sem partilha
Amando cada vez mais cada dia,
Tê´l’O enfim como único apoio
Sofrer com Ele o Calvário
Num pobre e santo mosteiro.
Sofrer, enfim! Sempre sofrer,
Oh, tal é meu ardente desejo!…
E diante do presépio oro
Com grande fervor,
Pedindo a Jesus Salvador
Que queira aceitar minha vida
Pela conversão dos pecadores,
Por aqueles que ultrajam Seu Coração!…
Neste pobre e frio estábulo,
Como é belo, o Menino Jesus!
Ó graça, ó prodígio, ó milagre,
Foi por mim, então, que Ele veio!
Ó doces carrilhões do Carmelo,
Voai alegremente ao Céu
Nesta noite misteriosa,
Tão pua e tão deliciosa.
A Confiança na Divina Providência (entre 8 e 29 de maio de 1898)
Tenho em Tua divina Providência
Uma inquebrantável confiança,
Ó Jesus, volta e retorna a mim
Porque me abandono toda em Ti.
No dia em que me disseste: “Vem a mim”,
Jesus, respondi a Tua voz
Então, quantas lágrimas verti
Oh, lembras-Te de minhas angustias?…
Lembras-te de meu santo desejo
De responder a Teu divino apelo,
De viver solitária no Carmelo,
De Te consagrar minha fraca vida?
Perdoa um momento de impaciência,
Senhor, faltou-me a confiança,
Mas pensa, tinha um tal desejo
De deixar tudo por Ti, de sofrer.
Mas não me desolarei mais,
Prometo-Te, ó meu Jesus.
Me abandono à Tua Providencia,
Nada alterara minha confiança.
Jesus, meu Salvador, Bondade Suprema,
Apesar de meu desejo, ardente, extremo,
Não aspiro, ideal Beleza,
Senão a fazer sempre Tua vontade.
Jesus em quem minha esperança se funde,
Se não posso responder a Tua voz,
Oh, quem poderá ao menos, neste mundo
Me impedir de me dar a Ti?…
Quem poderá arrebatar-me Teu Amor,
Divino Esposo, Jesus, ó minha vida!
Amar-Te e Te devolver Teu Amor,
Tal foi sempre meu santo desejo.
Oh, acalma-te, minha impaciência!
Minha alma, em Santa Providencia.
Abandona teus mais caros desejos,
Ele goste de te ver assim sofrer.
Neste mundo, neste vale sombrio,
Jesus, Tu dignas-Te reservar-me
Uma parte doce, uma parte feliz
Que o Mundo não me pode roubar.
Por esta parte que me escolheste,
Ó meu Deus, durante toda a minha vida,
O grito de meu coração será “Obrigado”.
Oh! Sim, obrigado, meu Celeste Amigo.
Agora abandono-me a Ti,
Numa deliciosa confiança.
Glória à Tua divina Providencia,
Glória a Deus, glória sempre a Ti!
A Oitava do Santíssimo Sacramento (10-17 de junho de 1898)
Cada dia, meu Bem-Amado Salvador
Vem repousar em meu fraco coração!
Cada dia tenha então a alegria extrema
De dizer a este doce Jesus que amo,
A este Deus que repousa em meu coração:
Amanhã, meu Bem-Amado Salvador,
Amanhã, Tu virás de novo,
Ó Tu que amo, ó Tu que adoro!
Então, depois destes puros colóquios
Deliciosos e de momentos bem curtos,
É preciso deixar o piedoso santuário
E deixar o divino Solitário…
Mas, ó alegria, ó graça, ó felicidade!
Eu logo virei perto do Salvador,
Na Capela das Carmelitas,
Estas virgens puras, estes corações de elite,
Àquelas a quem terei a felicidade
De poder chamar um dia de minhas irmãs.
Nesta pura e casta morada,
Venho passar uma boa hora
Perto do Bem-Amado de meu coração,
Do divino Esposo, do doce Salvador.
Nenhuma pena poderá descrever,
E sou incapaz de o dizer,
A divina, a inefável felicidade
De que Jesus inunda meu coração.
Mas sinto-me de tal maneira feliz
Durante esta hora tão deliciosa,
Onde falamos enfim coração a coração
Onde contamos nossas dores,
Nossas tristezas, nossos desejos íntimos,
Onde me ofereço como vítima
À imagem do divino Salvador
Pela volta dos pobres pecadores!
Aí venho receber força e coragem
E pedir a Cruz por participação.
Porque tenho sede! Oh sim, sede de sofrer,
Sem a Cruz prefiro morrer!
Oh, quero-a por única herança,
Quero-a por única partilha,
Esta Cruz em que meu Deus foi ciumento
E na qual morreu por nós.
Oh, esta Cruz Santa, este tesouro supremo
Que Jesus dá a todos aqueles que ama.
A Festa do Sagrado Coração (17 de junho de 1898)
Salve, amor, glória e honra,
Ó Jesus, a Teu divino Coração,
Este Coração inexaurível fonte,
Este Coração perene fonte.
Este Coração transpassado pela lança,
Este Coração esmagado pelo sofrimento,
Este Coração, ah, tão ultrajado,
Este Coração meu refúgio assegurado.
Cativo na prisão do Amor,
Ele sofre pela solidão,
Pelo esquecimento, pela ingratidão;
Todos os dias é abandonado!…
Ah! Como no Getsêmani,
Como na noite da agonia,
Ele está só, oh, quase sempre,
Este Coração tão transbordante de Amor!
O que é que Ele não fez por nós,
Este grande Deus, o Todo-Poderoso,
Este Deus de nosso amor ciumento,
Este Deus que sempre é ofendido?
Ó Coração Sagrado de meu Salvador,
Tu a quem adoro, a quem amo,
Tu todo Amor, Bondade Suprema,
Só Tu possuis meu coração.
Coração Sagrado do divino Amigo,
Sê aqui o meu apoio,
E que minha mais doce esperança
Seja particular de Teu sofrimento.
Eu aspiro tanto, ó doce Salvador,
A encontrar minhas delícias
Em consolar Teu divino Coração,
Em beber contigo o cálice.
A bebê-lo até ao fim,
Como na noite da agonia,
Depois escutar-Te-ei, doce Salvador,
Toda a História de Tuas dores.
Tentarei por meus sofrimentos,
Por meu amor, divino Salvador,
Consolar Teu divino Coração,
Visto que tal é a minha esperança.
Tal é meu ardente desejo,
Tal é meu voto mais íntimo,
De viver, sofrer e morrer
E me oferecer como vítima
Pelo Amor, pela glória e pela honra
Do Bem-Amado, do Sagrado Coração.
Perdão para o Pecador (17 de junho de 1898)
Perdoai, perdoai, Senhor!
Eis o grito de tantos corações.
Recebei, aceitai estas vítimas,
Dignai-Vos estar enternecido aos meus rogos.
Ah, vede, seu desejo mais íntimo,
Outro não é que expiar pelo pecador!
Ó Mestre que adoro (1º dezembro 1898)
Ó Mestre que adoro e amo
Bendigo-Te mesmo na provação,
Visto que queres que seja assim
Em minhas lágrimas digo-Te “obrigada”.
Ó Bom Jesus, Tu que sabes sofrer,
Ofereço-Te minha dor, meus suspiros,
Estes prantos que preciso esconder de minha mãe
O que os torna mais amargos.
Eu me lembro, choravas assim
Uma noite… depois outras vezes, doce Amigo.
Aceita meus prantos e minhas angústias,
Santificado estas ardentes lágrimas.
Oh, Tu que queres tanto à Virgem Mãe,
Tu lhe dás, meu tão Bom Salvador,
Tanto poder sobre Teu divino Coração
Que compreendes minha amarga dor.
Aqui neste Mundo efêmero,
Onde tudo passa, nesta triste Terra,
Há algo de bom, compassivo
Como aquela a quem se chama “Mamãe”?
É a ternura, o amor mesmo,
È ela a primeira a quem se ama,
Q queria deixá-la por Ti;
Meu esposo, meu salvador, ó meu Rei.
Eu sacrificaria tudo com felicidade
Tudo a meu Jesus, mesmo minha mãe,
Para responder ao apelo de Teu Coração
E para viver contigo solitária.
Mas envias-me um outro sofrimento:
No Mundo preciso levar minha cruz
Jesus, minha Força, minha Esperança,
Ah, quero levá-a contigo.
A Imaculada Conceição (8 de dezembro de [1898])
É A Imaculada Conceição,
A grande festa de Maria,
O sino em alegre carrilhão,
Ó piedosos peregrinos, vos convida.
À gruta de Nossa Senhora
De Lourdes, neste canto dos Céus,
Onde passa o sopro de Deus
Como uma ardente e pura chama.
Ó vós todos os que orais a Maria
Neste piedoso, neste belo vale,
Bendito depois da aparição,
Como, como vos invejo!
Como seria minha alma feliz
Em saborear estas alegrias misteriosas,
Doce antegozo das alegrias do Céu
Do lugar divino, eterno.
Visto que não tenho a felicidade
De orar à Virgem Maria
Na gruta piedosa e bendita,
Lugar privilegiado de seu Coração.
Que sempre faz sonhar com o Céu,
Ao menos irei orar a minha mãe
Na Capela solitária
De meu querido, bem-amado Carmelo.
Nesta piedosa solidão,
Oferecerei meus prantos, meus suspiros,
Minhas tristezas, minhas inquietações
A esta rainha dos mártires.
A esta Virgem das dores
Que verteu tão tristes prantos,
Cuja admirável e santa vida
Não foi senão uma longa agonia!
Oh, lembra-te disso, este Verão,
Nesta gruta misteriosa,
Sempre recolhida e tão piedosa,
Confiei-te minha pureza!
Dizia-te: Guarda o meu coração,
Trabalha-o para o Salvador,
Purifica-o pelo sofrimento,
Virgem em quem coloco minha confiança.
Oh, pedi-te cruzes
Para me assemelhar a ti, ó minha mãe,
Para me assemelhar ao divino rei,
Ao qual aspiro agradar.
Confiei-te as esperanças
Que faziam bater meu coração,
Dizia-te de minha impaciência
Em deixar tudo pelo Salvador.
Depois em tuas mãos com confiança,
Ó Maria, ó minha esperança,
Abandonei todos os meus desejos,
Minha vocação, meu futuro.
Sentia-me mais corajosa
Ao deixar este belo canto dos Céus,
Onde fui tão feliz
Em passar estes dias deliciosos.
Com uma viva impaciência,
Uma inquebrantável confiança,
Esperarei que o Bem-Amado
Manifeste Sua vontade.
E tu, Maria Imaculada,
Virgem que tanto invoquei
Vem em meu socorro, ajuda-me,
Levemos juntas esta Cruz.
Depois escuta esta oração,
Virgem, é o grito de meu coração:
Recomendo-te minha mãe,
Ah! Que ela ignore minha dor!
Faze que seja eu a única a sofrer,
Sempre só em minha angustia,
E santificarás estas lágrimas
Ó tu, Rainha dos mártires.
A Adoração Perpétua
Ó Jesus da Eucaristia,
Meu esposo, meu Amor, minha Vida,
Como gosto de vir toda a tarde
Escutar-Te, conversar contigo, ver-Te!…
Oh, como são doces estes coração-a-coração,
Oh, como são suaves estas lágrimas…
Estes momentos perto do Salvador…
Não posso dizer todos os encantos.
Meu Supremo Amor, ó meu Rei;
Jesus cativo e solitário,
Enquanto que estou perto de Ti,
Não me creio mais na terra.
Quando ouço falar Tua voz,
Ó meu esposo, ó meu bom Mestre,
Fazendo silêncio em todo o meu Ser,
Não percebo, não vejo senão a Ti.
Ó momentos de êxtases sublimes,
Uniões tão doces, tão íntimas,
Durante as quais sinto meu coração
Bater ao contato do Salvador!
O que não posso nesta morada
Santa, passar longas horas,
O que não posso vivendo sempre
Perto de Jesus, meu Único Amor?
Não me prendo a nada na Terra,
Jesus só pode me satisfazer,
Porque fora d’Ele, não me prendo a nada:
Ele é meu tesouro, meu único Bem.
Perto d’Ele só sou feliz, Ele é minha Vida, meu Amor,
Por Ele tenho tanto desejo
De sofrer, sofrer sempre!
Sofrer e consolar Seu Coração
Amargurado por tantas dores!
Sofrer! Oh, provar que o amo!
A Jesus meu Único Amor!
Jesus! Deus da Eucaristia!
Jesus! Meu Sustento e minha Vida!
Jesus, que se digna escolher-me
Para amar, consolar, sofrer!…
Primeira visita ao Carmelo (20 de junho de 1899)
Ó meu Jesus, meu Amado Supremo,
Ó meu Esposo, meu divino Amigo,
Ó Tu que sabes quanto Te amo,
Visto que lês em meu coração: obrigada
Por teres atendido à minha oração.
Venho de meu caro Mosteiro,
Vê que alegria inunda meu coração,
Bom Mestre, ofereço-Te a minha felicidade.
No pobre locutório do Carmelo,
Onde tudo respira um perfume do Céu,
Acabo de passar uma boa hora
Que realiza a minha esperança,
Com a boa e santa priora
Que doravante verei com freqüência.
O Coração ferido pelo infinito (1902)
“Não se pode dar uma grande prova de amor
Senão dando a vida por Aquele que se ama…”
Não percebes o grande silencio,
O hino de amor que se canta lá no alto?
Irmã, esqueçamos o exílio e o sofrimento,
E que nossos corações saúdem este dia tão belo!
Não vês o esplendor esterno,
A Trindade que se debruça sobre nós?
O Céu se entreabre: escuta… chamam-nos…
Recolhamo-nos, minha Irmã, eis o Esposo!
Não Vês a nuvem luminosa
Que até nós projeta sua claridade?
Ah, permaneçamos lá completamente silenciosas,
Fixando a Imutável beleza!
De nosso Cristo o olhar se clarifica
Ao imprimir a pureza de Deus.
Irmã, permaneçamos, para que Ele nos deifique,
A alma em sua alma e os olhos em seus olhos.
Ele vem, Ele próprio, diante das virgens
Para lhes dar o inefável beijo.
Ele passa aqui, Sua sombra nos protege.
Olhemo-l’O para nos virginizar.
Ele é tão belo, o Cristo, Esplendor do Pai,
Iluminado pela Divindade,
Ele é, Ele próprio, uma fogueira de luz
Envolvendo os seus em Sua Claridade
Amemos, minha irmã, e que tudo desapareça.
A alma amando se identifica a sue Deus.
Não esperemos que sua glória apareça
Para contemplar como os bem-aventurados!
Ele está em nós, nós temo-lo por sua graça,
E como no Céu já O adoramos!
Mas logo ao contemplar Sua Face,
Seu Nome divino brilhará sobre nossas frontes!
Quando, então, será o fim da espera?
Quando poderemos, enfim, nos imolar?
Esperando, sejamos totalmente adorantes,
Porque nosso Cordeiro quer nos purificar.
Não percebes a paixão suprema
De dar ao Cristo um pouco de seu amor?
Eu quero morrer, para Lhe dizer: “Eu te amo,
E como tu, eu me entrego neste dia!”
Santa Teresa no Céu deve-nos sorrir
Porque ela também quis fugir um dia.
Deus reservou-lhe outro martírio,
Ela morreu “Vítima do Amor!”
Oh! Como é belo o martírio das virgens
Aquele dos corações feridos pelo Infinito,
Tormento divino em que o amor é a espada!
Dardo inflamado, transpassa-nos também!
SANTA TERESINHA DO MENINO JESUS
O meu canto de hoje
1. A minha visa é um só instante, uma hora passageira
A minha vida é um só dia que me escapa e me foge
Tu sabes, ó meu Deus! Para amar-Te na terra
Só tenho o dia de hoje!…
2. Oh! Amo-Te, Jesus! A minha alma por Ti suspira
Sê por um só dia o meu doce apoio.
Vem reinar no meu coração, dá-me o teu sorriso
Somente por hoje!
3. Que me importa, Senhor, se o futuro é sombrio?
Nada posso pedir-Te, oh não, para amanhã!…
Conserva-me o coração puro, cobre-me com a tua sombra
Somente por hoje.
4. Se penso em amanhã, temo a minha inconstância
Sinto nascer em mim a tristeza e o desgosto.
Mas aceito, meu Deus, a prova, o sofrimento
Somente por hoje.
5. Quero ver-Te em breve nas margens eternas
Ó Divino Piloto! Cuja mão me conduz.
Nas ondas alterosas guia em paz a minha barca
Somente por hoje.
6. Ah! Deixa-me, Senhor, esconder na tua Face,
Onde já não ouvirei o ruído vão do mundo
Dá-me o teu amor, conserva-me na tua graça
Somente por hoje.
7. Junto do teu Coração divino, esqueço tudo o que passa
Já não receio os pavores da noite
Ah! Dá-me, Jesus, um lugar nesse Coração
Somente por hoje.
8. Pão vivo, Pão do Céu, divina Eucaristia
Ó Mistério sagrado!que o Amor produziu…
Vem habitar no meu coração, Jesus, minha Hóstia branca
Somente por hoje.
9. Digna-Te unir-me a Ti, Vinha Santa e sagrada
E a minha frágil vergôntea dar-Te-á o seu fruto
E poderei oferecer-Te um cacho dourado
Senhor, desde hoje.
10. Este cacho de amor, cujos bagos são almas
Para o formar só tenho este dia que foge
Ah! dá-me, Jesus, o ardor de um Apóstolo
Somente por hoje.
11. Ó Virgem Imaculada! Tu és a Doce estrela
Que me dás Jesus e me unes a Ele.
Ó Mãe! Deixa-me repousar sob o teu manto
Somente por hoje.
12. Santo Anjo da Guarda, cobre-me com as tuas asas
Ilumina com a tua luz o caminho que eu sigo
Vem dirigir-me os passos… ajuda-me, por ti chamo
Somente por hoje.
13. Senhor, eu quero ver-Te, sem véu, sem nuvem,
Mas ainda exilada, longe de Ti, desfaleço
Que o teu adorável rosto de mim seja escondido
Somente por hoje.
14. Voarei em breve para cantar os teus louvores
Quando o dia sem ocaso brilhar sobre a minha alma
Então eu cantarei com a lira dos Anjos
O Eterno Hoje!…
Maria do Sagrado Coração
O retrato de uma alma que eu amo
Eu conheço um coração, uma alma fervorosa,
Que recebeu do Céu uma sublime Fé,
Nada pode na terra arrebatar esta alma ardente:
Somente a Jesus ela chama seu Rei.
Enfim, esta alma bela é grande e generosa,
Doce e viva, sempre humilde de coração.
Um horizonte distante… a estrela luminosa
Bastam muitas vezes para a unirem ao Senhor.
Vi-a outrora amando a independência
Procurar a felicidade pura e a verdadeira liberdade…
Espalhar benefícios era o seu prazer
E esquecer-se sempre de si, a sua única vontade!…
O Coração divino cativou esta alma
Obra do seu amor, digna do Criador
Um dia vê-la-ei como uma pura chama
Resplandecer no Céu junto do Coração Sagrado.
Um grato coração de filha
Oração da filha de um santo
Lembra-te de que outrora na terra
A tua única delícia era amar-nos
Ouve a oração das tuas filhas
Protege-nos, digna-te abençoar-nos
De novo encontras lá no Alto a nossa Mãe querida
Que te havia precedido na Pátria Santa.
Agora nos Céus
Vós reinais os dois
Velai por nós!…
Lembra-te da tua bem-amada Maria
A tua filha mais velha, mais querida ao teu coração
Lembra-te de que ela encheu a tua vida
Com o seu amor, de graça e de ventura…
Por Deus renunciaste à sua doce presença
E bendisseste a mão que te oferecia a dor…
Oh! do teu Diamante
Sempre mais cintilante
Lembra-te!…
Lembra-te da tua linda pérola fina
Que conheceste fraco e tímido cordeiro
Vê-a cheia de uma força divina
A conduzir do Carmelo o rebanho.
Das tuas outras filhas ela tornou-se Mãe
Papá! vem guiar aquela que te é tão querida!…
E sem deixares o Céu
Do teu pequeno Carmelo
Lembra-te!…
Lembra-te da oração ardente
Que fizeste pela tua terceira filha
Deus ouviu-te, porque ela é na terra
Como as irmãs, uma pura açucena brilhante
A Visitação esconde-a aos olhos do mundo
Mas ela ama Jesus, é a sua paz que a inunda.
Dos seus desejos
E ardentes suspiros
Lembra-te!…
Lembra-te da tua querida Celina
Que foi para ti como um anjo dos Céus
Quando um olhar da Face Divina
Veio provar-te por uma eleição gloriosa…
Tu reinas no Céu… a sua missão está cumprida
Agora entrega a Jesus a sua vida…
Protege a tua filha
Que muitas vezes diz
Lembra-te!…
Lembra-te da tua rainhazinha
A pequena órfã da beresina
Lembra-te de que sempre a tua mão
Guiou os seus passos hesitantes
Ó Papá, lembra-te de que nos dias da sua infância
Quiseste guardar só para Deus a sua inocência!…
E dos seus cabelos loiros
Que encantavam os teus olhos
Lembra-te!…
Lembra-te de que na paz do miradouro
Sempre a sentavas nos teus joelhos
E rezando então uma oração
Embalava-la com a tua doce melodia
Ela via no teu rosto um reflexo do Céu
Quando o teu olhar profundo mergulhava no espaço
E da Eternidade
Cantavas a beleza
Lembra-te!…
Lembra-te do domingo radioso
Em que estreitando-a no teu peito paternal
Lhe deste uma florzinha branca
Permitindo-lhe voar para o Carmelo
Ó Papá! Lembra-te de que nas suas grandes provações
Do mais sincero amor provas lhe deste
Em Roma e em Bayeux
Mostraste-lhe os Céus
Lembra-te!…
Lembra-te de que a mão do Santo Padre
No Vaticano sobre s tua fronte se pousou
Mas não pudeste compreender o mistério
Do selo Divino que sobre ti se gravou…
Agora as tuas filhas fazem-te a sua oração
Abençoam a tua Cruz e a tua dor amarga!…
Sobre a tua fronte gloriosa
Resplandecem nos Céus
Nove Lírios em flor!!!…
A órfã de Beresina
História de uma pastora que se tornou rainha
Neste belo dia, ó Madalena!
Vimos cantar junto de vós
A maravilhosa e doce cadeia
Que vos une ao vosso esposo,
Escutai a história encantada
De uma pastora que um grande Rei
Quis um dia cumular de glória
E que respondeu à sua voz.
Refrão:
Cantemos a Pastora
Pobre sobre a terra
Que o Rei do Céu
Desposa hoje no Carmelo.
Uma pobre pastorinha
Que fiava a guardar os cordeiros
Admirava cada florzinha
Escutava o canto das aves
E compreendia a doce linguagem
Dos grandes bosques e do céu azul
Tudo para ela era uma imagem
Que lhe revela o poder de Deus.
Ela amava a Jesus e Maria
Com um ardor muito grande
Eles também amavam Melânia
E vieram falar-lhe ao coração.
Queres, dizia a Doce Rainha,
Junto de mim, no Monte Carmelo
Queres chamar-me Madalena
E somente ganhar o Céu?
Menina, deixa estes campos,
Não tenhas pena do teu rebanho,
Lá no alto, na minha morada santa
Jesus será o teu único Cordeiro.
Oh! vêm, a tua alma encantou-me
Repetia igualmente Jesus
Recebo-te por minha noiva,
Serás minha para sempre.
Muito ditosa a humilde pastora
Respondendo a este doce apelo
Protegida por Maria, sua Mãe
Chegou aos cumes do Carmelo.
Sois vós, Maria Madalena!
Que nós festejamos neste dia.
A pastora transformada em Rainha
Junto do Rei Jesus, seu amor!…
Vós sabeis, Irmã muito querida,
Servir o nosso Deus, é reinar
O Doce Salvador durante a sua vida
Não cessava de no-lo ensinar:
Se na Pátria Celeste
Quiserdes ser o primeiro
É preciso durante a vossa vida
Esconder-vos… Ser o derradeiro.
Sois feliz, Madalena,
Rezando a Deus no Carmelo
Haveria para vós alguma pena
Estando tão próximo do Céu?…
Vós imitais Marta e Maria
Rezar, servir o doce Salvador
Eis toda a vossa vida
Toda a verdadeira felicidade.
Se por vezes o sofrimento amargo
Viesse visitar o vosso coração
Fazei dele a vossa alegria:
Sofrer por Deus… que ventura!…
Então as ternuras Divinas
Far-vos-ão depressa esquecer
Que caminhais sobre espinhos
E julgareis então voar…
Hoje o anjo inveja-vos
Quisera saborear a dita
Que vós possuís, ó Maria!
Sendo a esposa do senhor.
Sim, vós sois desde esta vida
A esposa do rei dos eleitos
Um dia na Pátria santa
Reinareis junto de Jesus.
Último refrão:
Em breve a Pastora
Pobre sobre a terra
Voando para o Céu
Reinará junto do eterno.
Às nossas Venerandas Madres.
É a vós, boas, ternas Madres
Que Madalena nossa Irmã
É aos vossos cuidados e orações
Que ela deve a paz, a felicidade.
Ela saberá reconhecer bem
O vosso amor eterno e maternal
Suplicando ao seu Divino Mestre
Que vos encha dos bens do Céu.
Refrão:
E nas vossas coroas
Ó Mães bondosas,
Brilhará a flor
Que ofereceis ao Deus Salvador.
É junto de vós, Virgem Maria
É junto de vós, Virgem Maria,
Que vimos cantar nesta tarde
Rezando pela filha querida
De quem vós sois a única esperança.
No dia bendito da vossa espera
Vós fazeis feliz o seu coração
Ela estabelece no Carmelo a sua morada
E só espera pelos Santos Votos.
Este belo dia, ó doce Maria,
Traz-lhe uma doce recordação
Num outro dia da sua vida
O vosso manto veio cobri-la.
O burel é-lhe enfim restituído
Duas vezes tomou o vosso hábito
Que ela seja também revestida
Mãe, do vosso duplo espírito.
Ela cantou: Tenho coragem!…
– É verdade, dissemo-lo baixinho
Ela cantou: Gosto do trabalho!
– O trabalho aqui nunca falta!…
Mas a força é coisa muito boa
Para trabalhar com ardor
Nas faces dela, ponde uma rosa
Ó Mãe, a brilhante cor!…
Para ela a espera acabou
O seu coração saboreia a pa do Céu,
Com o traje de Noivado
Jesus quer vê-la no Natal.
Que Ele se digne esconder na sua Face
Doce Mãe, o vosso humilde cordeiro
É aí que ele reclama um lugar
Não desejando ter outro berço.
Dignai-vos ouvir, ó Maria!
Os desejos do vosso pobre cordeiro.
Durante a noite desta vida
Escondei-o sob o vosso manto.
Escutai as suas orações
E que o vosso coração Maternal
Lhe conserve longamente as Madres
Que de novo lhe dão o seu querido Carmelo!…
Ao nosso Pai São José José, a vossa vida admirável
Passou-se na pobreza,
Mas, de Jesus e de Maria
Vós contempláveis a beleza.
Refrão:
José, ó terno Pai
Protegei o Carmelo
Que as vossas filhas nesta terra
Saboreiem sempre a paz do Céu! (bis)
O Filho de Deus, na sua infância
Mais de uma vez com felicidade,
Submisso à vossa obediência
Descansou sobre o vosso coração.
Como vós na solidão
Nós servimos Maria e Jesus,
Agradar-Lhes é a nossa única ciência
Não desejamos nada mais…
Santa Teresa nossa Mãe
Invocava-vos com amor
Ela garante que a sua oração
Vós a ouvistes sempre.
Após o exílio desta vida
Disso temos a doce esperança
Com Maria nossa Mãe querida
São José, iremos ver-vos.
Último refrão:
Abençoai, terno Pai
O nosso pequeno Carmelo,
Depois do exílio desta terra
Reunamo-nos lá no Céu! (bis)
(Música: Queremos Deus)
Vivei de Amor
1. Na tarde de Amor, falando sem parábola
Jesus dizia: “Se alguém quiser amar-Me
“Por toda a sua vida, guarde a minha Palavra”
“O meu pai e Eu viremos visitá-lo”.
“E do seu coração fazendo a nossa morada”.
“Unindo a ele, amá-lo-emos sempre!…”.
“Cheio de paz, queremos que ele permaneça”.
“No nosso Amor!…”
2. Viver de Amor, ´guardar-Te e Ti mesmo
Verbo incriado, Palavra do meu Deus,
Ah! Tu sabe-l’O, Divino Jesus, eu amo-Te
O Espírito de Amor abrasa-me com o seu fogo
Amando-Te eu atraio o Pai
O meu pobre coração guarda-O para sempre.
Ó Trindade! Vós sois prisioneira
Do meu Amor!…
3. Viver de Amor, é viver da tua vida,
Rei glorioso, delícia dos eleitos.
Tu vives por mim, escondido numa hóstia
Quero esconder-me por Ti, ó Jesus!
A solidão é necessária aos amantes
Um abrir o coração que dure noite e dia,
Basta o teu olhar para me fazer feliz
Vivo de Amor!…
4. Viver de Amor, não é sobre a terra
Instalar a sua tenda no cimo do Tabor.
Com Jesus, é subir ao Calvário,
É contemplar a Cruz como um tesouro!…
No Céu a minha vida será de gozo
A provação terá acabado para sempre
Mas exilada quero no sofrimento
Viver de Amor.
5. Viver de Amor, é dar sem medida
Sem reclamar salário aqui na terra
Ah! Sem contar eu dou-me bem segura
De que, quando se ama, não se conta!…
Ao Coração Divino, transbordante de ternura
Dei tudo… ligeiramente eu corro
Nada tenho senão a minha única riqueza
Viver de Amor.
6. Viver de Amor, é dissipar o medo
Afastar a lembrança das faltas do passado.
Dos meus pecados não encontro vestígios,
Num breve instante o amor queimou tudo…
Chama divina, ó dulcíssima Fornalha!
No teu centro fixo a minha morada
É no teu fogo que eu canto alegremente:
“Vivo de Amor!…”
7. Viver de Amor, é guardar em si mesma
Um grande tesouro num vaso mortal
Meu Bem-Amado, a minha fraqueza é extrema
Ah! Estou longe de ser um anjo do Céu!…
Mas se caio em cada hora que passa
Tornando a erguer-me vens em meu auxilio,
Em cada instante me dás a tua graça
Vivo de Amor.
8. Viver de Amor, é navegar sem tréguas
Semeando a paz, a alegria nos corações
Piloto Amado, a Caridade incita-me
Pois vejo-Te nas almas minhas irmãs.
A Caridade, eis a minha única estrela
À sua luz navego sem desvio
Tenho a minha divisa escrita na vela:
“Viver de Amor”.
9. Viver de Amor, quando Jesus dormita
É o repouso sobre vagas alterosas
Oh! Não receies, Senhor, que Te desperte
Eu espero em paz a margem dos céus…
A fé em breve rasgará o seu véu
A minha Esperança é ver-Te um dia
A Caridade enche e impele a minha vela
Vivo de Amor!…
10. Viver de Amor, é, Divino Mestre,
Suplicar-Te que derrames o teu fogo
Na alma santa e sagrada do Sacerdote
Que ele seja mais puro do que um Serafim dos céus!…
Ah! Glorifica a tua Igreja imortal
Aos meus anseios, Jesus, não fiques surdo
Eu, sua filha, imolo-me por ela
Vivo de Amor.
11. Viver de Amor, é enxaguar-Te a Face
É alcançar o perdão dos pecadores
Ó Deus de Amor! Que eles voltem à tua graça
E que para sempre bendigam o teu Nome…
Até ao coração me chega a blasfêmia
Para apagá-la quero sempre cantar:
“O te Nome Sagrado, eu O adoro e Amo”.
Vivi de Amor!…
12. Viver de Amor, é imitar Maria,
Ao banhar de lágrimas, de perfumes preciosos,
Os teus divinos pés, que beija deslumbrada
Enxugando-os com os seus longos cabelos…
Depois levantando-se, quebra o vaso
O teu Doce Rosto ela também perfuma.
Por mim, o perfume que derramo no teu Rosto
É o meu Amor!…
13. “Viver de Amor, que estranha loucura!”
Diz-me o mundo, “Ah! Cessa de cantar”,
“Não percas os teus perfumes, a tua vida”,
“Aprende a empregá-la utilmente!…”
Amar-Te, Jesus, que perda fecunda!…
Todos os meus perfumes são teus para sempre,
Quero cantar ao sair deste mundo:
“Morro de Amor!”
14. Morrer de Amor, é dulcíssimo martírio
É aquele que eu desejaria sofrer.
Ó Querubins, afinai a vossa lira,
Porque sinto que o meu exílio vai terminar!…
Chama de Amor, consome-me sem tréguas
Vida de um instante, pesa-me o teu fardo!
Divino Jesus, realiza o meu sonho:
Morrer de Amor!…
15. Morrer de Amor, eis a minha esperança
Quando vir quebrarem-se os meus laços
O Meu Deus será a minha Grande Recompensa
Não anseio possuir outros bens.
Quero ser abrasada pelo seu Amor
Quero vê-l’O, unir-me a Ele para sempre
Eis o meu Céu… eis o meu destino:
Viver de Amor!!!
O meu céu!…
Para suportar o exílio do vale das lágrimas
Preciso do olhar do meu Divino Salvador
Este olhar cheio de amor revelou-me os seus encantos
Fez-me pressentir a felicidade Celeste.
O meu Jesus sorri-me quando suspiro por Ele.
Então já não sinto a provação da fé
O Olhar do meu Deus, o seu encantador sorriso
Eis o meu Céu!…
O meu Céu é poder atrair sobre as almas
Sobre a Igreja minha mãe e sobre todas as minhas irmãs
As graças de Jesus e as suas Divinas chamas
Que sabem abrasar e alegrar os corações.
Posso tudo alcançar quando em segredo
Falo a sós com o meu Divino Rei
Esta doce Oração juntinho do Santuário
Eis o meu Céu!…
O meu Céu está oculto na Hóstia pequenina
Onde Jesus, meu Esposo, se esconde por amor
A este Fogo Divino eu vou buscar a vida
E nele o meu Salvador ouve-me noite e dia.
Oh! que feliz instante quando na tua ternura
Vens, meu bem-amado, transformar-me em Ti
Esta união de amor, esta inefável loucura
Eis o meu Céu!…
O meu Céu é sentir em mim a semelhança
Do Deus que me criou com o seu Sopro Poderoso
O meu Céu é ficar sempre na sua presença
Chamar-Lhe meu Pai e ser sua filha
Nos seus braços Divinos, não receio a tempestade
O total abandono é a minha única lei.
Dormitar no seu Coração, bem junto do seu Rosto
Eis o meu Céu!…
O meu Céu, encontrei-o na Trindade Santíssima
Que habita no meu coração, prisioneira de amor
Aí, contemplando o meu Deus, repito-Lhe sem receio
Que o quero servir e amar para sempre.
O meu Céu é sorrir a este Deus que adoro
Quando ele quer esconder-SE para me provar a fé
Sofrer enquanto espero que ele me olhe de novo
Eis o meu Céu!…
A Nossa Senhora das Vitórias, Rainha das Virgens, dos Apóstolos e dos Mártires
Vós que encheis a minha esperança,
Ó Mãe! Escutai o humilde canto
De amor e de gratidão
Que vem do coração da vossa filha…
Às obras de um Missionário
Unistes-me para sempre,
Pelos laços da oração
Do sofrimento e do amor.
Ele tem de percorrer a terra
De pregar o nome de Jesus.
Eu tenho, na sombra e no segredo
De praticar humildes virtudes.
Reclamo para mim o sofrimento,
Amo e desejo a Cruz…
Para ajudar a salvar uma alma
Quisera morrer mil vezes!…
Ah! pelo Conquistador das almas
Quero imolar-me no Carmelo
E por ele espalhar as chamas
Que Jesus trouxe do Céu.
Por ele, deslumbrante mistério,
Até ao Su-tchuen oriental
Eu poderei da minha eterna Mãe
Fazer amar o nome Virginal!…
Na minha solidão profunda
Maria, quero ganhar orações,
Pelo vosso Apóstolo, nos confins do mundo
Converterei os pecadores…
Por ele, a água santa do batismo,
Do pequenino de um só dia
Fará o templo onde o próprio Deus
Se digna habitar no seu amor.
Quero povoar de pequenos anjos
A brilhante morada eterna…
Por ele, infantis falanges
Levantarão vôo para o Céu!…
A palma que a minha alma deseja,
Por ele, poderei colhê-la,
Oh que esperança! Mãe Querida
Serei a irmã de uma Mártir!!!
Depois do exílio desta vida
Na tarde do glorioso combate
Nós gozaremos na Pátria
Os frutos do nosso apostolado.
Para ele a hora da vitória
Diante do exército dos Bem-aventurados
Para mim… o reflexo da sua Glória
Eternamente nos Céus!…
A irmãzinha de um Missionário.
As Sacristãs do Carmelo
Aqui na terra o nosso doce ofício
É preparar para o altar,
O pão, o vinho do Sacrifício
Que dá a terra: O CÉU!
O Céu, ó mistério supremo!
Esconde-se sob um humilde pão
Porque o Céu, é o próprio Jesus
Que vem a nós todas as manhãs.
Não há rainhas na terra
Mais ditosas do que nós
O nosso ofício é uma oração
Que nos une ao nosso Esposo.
As maiores honras do mundo
Não se podem comparar
À paz celestial e profunda
Que Jesus nos faz saborear.
Sentimos uma santa inveja
Da obra das nossas mãos,
A hóstia pequena e branca
Que esconderá o Cordeiro divino.
Mas o seu amor escolheu-nos
Ele é nosso esposo, nosso Amigo.
Somos também pequenas hóstias
Que Jesus n’Ele quer transformar.
Missão sublime do sacerdote,
Tornas-Te a nossa na terra
Transformadas pelo Divino Mestre
É Ele que dirige os nossos passos.
Temos que ajudar os Apóstolos
Pela oração, pelo nosso amor
Os seus campos de luta são os nossos
Poe eles combatemos cada dia.
O Deus oculto do tabernáculo
Que se esconde também nos corações
À nossa voz, ó que milagre!
Digna-Se perdoar aos pecadores!
A nossa dita e a nossa glória
É trabalhar para Jesus.
O seu belo Céu eis o cibório
Que queremos encher de eleitos!…
As minhas armas
Vesti as armas do Onipotente
A sua mão divina dignou-Se adornar-me
Nada doravante me fará temer
Quem poderá separar-me do seu amor?
A seu lado, lançando-me na arena
Não temerei o ferro nem o fogo
Os meus inimigos saberão que sou rainha
Que sou a esposa de um Deus
Ó meu Jesus! Guardarei a armadura
Que me cinge perante os teus olhos adorados
Até ao entardecer da vida, o meu mais belo adorno
Serão os meus Votos sagrados!
Ó pobreza, meu primeiro sacrifício
Até à morte por toda à parte me seguirás
Pois eu sei que para correr no estádio
O atleta tem de despojar-se de tudo.
Provai, mundanos, o remorso e a pena
Esses frutos amargos da vossa vaidade.
Alegremente, eu acolho na arena
As palmas da Pobreza.
Jesus disse: É pela violência
Que se conquista o reino dos Céus.
Pois bem! A Pobreza me servirá de Lança
De Capacete glorioso.
A Castidade faz-me irmã dos anjos
Desses Espíritos vitoriosos e puros.
Espero voar um dia nas suas falanges
Lutarei sem repouso e sem tréguas
Pelo meu Esposo, o Senhor dos senhores.
A Castidade é o Gládio celeste
Que pode conquistar-Lhe os corações
A Castidade é a minha arma invencível
Os meus inimigos por ela são vencidos
Por ela eu torno-me, ó ventura indizível!
A Esposa de Jesus.
O anjo orgulhoso no meio da luz
Gritou: Não obedecerei!
Eu grito na noite da terra
Quero sempre na terra obedecer.
Sinto nascer em mim uma santa audácia
Do inferno inteiro desafio o furor,
A Obediência é a minha forte Couraça
E o Escudo do meu coração.
Deus dos Exércitos, não quero outras glórias
Senão a de submeter em tudo a minha vontade
Já que o Obediente cantará as suas vitórias
Pó toda a Eternidade.
Se tenho do Guerreiro as armas poderosas
Se o imito e luto corajosamente
Como a Virgem de encantos graciosos
Quero também cantar ao combater.
Fazes vibrar da tua lira as cordas
E esta lira, Jesus, é o meu coração!
Posso então das tuas Misericórdias
Cantar a força e a doçura
A sorrir enfrento os combates
E nos teus braços, ó meu esposo Divino
Cantando morrerei, no campo de batalha
De armas na mão!…
Uma rosa desfolhada
Jesus, quando Te vejo seguro pela tua Mãe
Abandonar os seus braços
E tentar vacilante na nossa triste terra
Dar os teus primeiros passos,
Diante de Ti quereria desfolhar uma rosa
Em plena frescura
Para que o teu pezinho docemente repouse
Sobre uma flor!…
Esta rosa desfolhada é a fiel imagem
Divino Menino
Do coração que quer imolar-se por Ti sem partilha
A cada instante.
Senhor, nos teus altares mais de uma fresca rosa
Gosta de brilhar
Ela dá-se a Ti… mas eu sonho outra coisa:
É desfolhar-me!…
A rosa com seu brilho pode alegrar a festa
Amável menino,
Mas a rosa desfolhada simplesmente lança-se
Ao sabor do vento.
Uma rosa desfolhada sem procura dá-se
Para já não ser.
Como ela com alegria abandono-me a Ti
Menino Jesus.
Passa-se sem mágoa sobre pétalas de rosa
E estes restos
São um simples ornamento que se dispõe sem arte
Assim compreendi.
Jesus, por teu amor prodigalizei a vida
O meu futuro
Aos olhos dos mortais rosa para sempre murcha
Tenho de morrer!…
Por Ti, tenho de morrer, Jesus, Suma Beleza
Que feliz sorte!
Quero ao desfolhar-me provar-Te que Te amo
Ó meu Tesouro!…
Sob os teus pezinhos, quero em segredo
Viver na terra
E quereria ainda suavizar no Calvário
Os teus últimos passos!…
Por que te amo, ó Maria!
1.Oh! Quisera cantar, Maria, por que te amo
Porque é que o teu nome tão doce me faz vibrar o coração
E porque é que o pensamento da tua grandeza suprema
Não poderia inspirar à minha alma o sentimento do temor.
Se eu te contemplasse na tua sublime glória
E mais brilhante do que todos os bem-aventurados,
Não poderia acreditar que sou tua filha
Ò Maria, diante de ti, eu baixaria os olhos!…
2. É preciso que uma filha possa amar a sua mãe
Que esta chore com ela, partilhe as suas dores
Ò minha Mãe querida, na terra estrangeira
Para me atraíres a ti, quanto chorastes!…
Meditando a tua vida no santo Evangelho
Ouso olhar-te e aproximar-me de ti
Acreditar que sou tua filha não me é difícil
Pois vejo-te mortal e sofrendo como eu…
3. Quando um anjo do Céu te oferece seres a Mãe
Do deus que há-de reinar por toda a eternidade
Vejo-te preferir, Ó Maria, que mistério!
O inefável tesouro da virgindade.
Compreendo que a tua alma, ò Virgem Imaculada
Seja mais querida ao senhor do que a divina morada
Compreendo que a tua alma, Humilde e Manso Vale
Possa conter Jesus, o Oceano do Amor!…
4. Oh! Amo-te, Maria, quando te dizes a serva
Do Deus que tu deslumbras com a tua humildade
Esta virtude oculta torna-te onipotente
Atrai ao teu coração a Santíssima Trindade
Então o Espírito de Amor cobrindo-te com a sua sombra
O Filho igual ao pai em ti encarnou…
Grande será o número dos seus irmãos pecadores
Já que se Lhe há-de chamar: Jesus, o teu primogênito!…
5. Ó Mãe bem-amada, apesar da minha pequenez
Como tu possuo em mim o Onipotente
Mas eu tremo ao ver a minha fraqueza:
O tesouro da mãe pertence ao filho
E eu sou tua filha, ó minha Mãe querida!
As tuas virtudes, o teu amor, acaso não são meus?
Por isso quando a Hóstia branca vem ao meu coração
Jesus, o teu Manso Cordeiro, julga repousar em ti!…
6. Fazes-me sentir que não é impossível
Seguir os teus passos, ó Rainha dos eleitos,
O estreito caminho do Céu, tornaste-o visível
Praticando sempre as mais humildes virtudes.
Junto de ti, Maria, gosto de permanecer pequena,
Das grandezas da terra vejo toda a vaidade
Em casa de Santa Isabel, recebendo a tua visita,
Aprendo a praticar a ardente caridade.
7. Lá escuto encantada, Doce Rainha dos anjos,
O cântico sagrado que brota do teu coração
Ensinas-me a cantar os divinos louvores
A glorificar-me em Jesus meu Salvador.
As tuas palavras de amor são místicas rosas
Que hão de aromatizar os séculos futuros.
Em ti o Onipotente fez grandes coisas
Quero meditá-las, para O bendizer.
8. Quando São José ignora o prodígio
Que com a tua humildade querias ocultar
Deixa-lo chorar junto ao Tabernáculo
Que esconde a divina beleza do Senhor!…
Oh! Como eu amo, Maria, o teu silêncio eloqüente,
Para mim é um concerto doce e melodioso
Que me revela a grandeza e a onipotência
De uma alma que só espera o seu auxílio dos Céus…
9. Mais tarde em Belém, ó José e Maria!
Vejo-vos rejeitados por todos os habitantes
Ninguém quer receber na sua hospedaria
Uns pobres estrangeiros, o lugar é para os grandes…
O lugar é para os grandes e é num estábulo
Que a Rainha dos Céus dará à luz um deus.
Ó minha Mãe querida, quão amável me pareces
Como te acho grande num lugar tão pobre!…
10. Quando vejo o Eterno envolvo em paninhos
Quando do Verbo Divino oiço o débil vagido,
Ó minha Mãe querida, já não invejo os anjos
Pois o seu Poderoso Senhor é o meu Irmão querido!…
Como te amo, Maria, tu que na terra
Fizeste desabrochar esta Divina Flor!…
Como te amo quando escutas os pastores e os magos
E guardas todas as coisas no teu coração!…
11. Amo-te quando te misturas com as outras mulheres
Que para o santo templo dirigiram os passos
Amo-te quando apresentas o Salvador das nossas almas
Ao ditoso Ancião que o aperta nos braços,
A princípio sorrindo escuto o seu cântico
Mas depressa o seu tom me faz derramar lágrimas.
Mergulhando no futuro um olhar profético
Simeão apresenta-te uma espada de dores.
12. Ó rainha dos mártires, até ao fim da vida
Esta espada dolorosa trespassará o teu coração
Tens já de deixar o solo da tua pátria
Para evitares de um rei o furor invejoso.
Jesus dormita em paz sob as pregas do teu véu
José vem pedir-te para partires depressa
E a tua obediência logo se revela
Partes sem demora e sem objeção.
13. Na terra do Egito, parece-me, ó Maria
Que na pobreza o teu coração continua feliz,
Pois não é Jesus a nossa formosa Pátria,
Que te importa o exílio se tu possuís os Céus?…
Mas em Jerusalém, uma tristeza amarga
Como um vasto oceano te inunda o coração
Jesus, durante três dias, esconde-se da tua ternura
É então o exílio em todo o seu rigor!…
14. Enfim encontra-lo e a alegria invade-te,
Dizes ao lindo menino que deslumbra os doutores:
“Ò meu Filho,porque procedeste assim?”.
“Teu pai e eu procurávamos-Te chorando.”
E o Deus Menino responde (que profundo mistério!)
Á Mãe querida que Lhe estende os braços:
“Porque me procuráveis?… Das coisas do meu Pai
É preciso que Eu me ocupe; não o sabeis já?”
15. O Evangelho ensina-me que crescendo em sabedoria
A José, a Maria, Jesus continua submisso
E o coração revela-me com que ternura
Sempre obedeceu aos seus queridos pais.
Agora compreendo o mistério do tempo,
As palavras ocultas de um amável Rei.
Mãe, o teu doce Filho quer que sejas o exemplo
Da alma que O procura na noite da fé.
16. Já que o Rei dos Céus quis que a sua Mãe
Mergulhasse na noite, na angústia do coração,
Maria, é então um bem sofrer na terra?
Sim, sofrer amando, é a felicidade mais pura!…
Tudo o que Ele me deu Jesus pode tomá-lo
Diz-lhe que nunca Se constranja comigo…
Ele pode esconder-Se, eu consinto em esperá-l’O
Até ao dia sem ocaso em que se extinguirá a fé…
17. Sei que em Nazaré, Mãe cheia de graça
Viveste pobremente, não querendo nada mais
Nem arroubamentos, nem milagres, nem êxtases
Embelezam a tua vida, Ó Rainha dos Eleitos!…
O número dos pequenos é bem grande na terra
Eles podem sem receio erguer os olhos para ti
É pela via comum, incomparável Mãe
Que te apraz caminhar guiando-os para o Céu.
18. Esperando o Céu, ó minha Mãe querida,
Quero viver contigo, seguir-te em cada dia
Mãe, ao contemplar-te, afundo-me absorta
Descobrindo no teu coração abismos de amor.
O teu olhar maternal desvanece os meios receios
Ensina-me a chorar, e a regozijar-me.
Em vez de desprezar as alegrias puras e santas
Tu queres partilhá-las, dignas-te abençoá-las.
19. Ao veres a aflição dos esposos de Caná
Que não podem esconder, pois falta-lhes o vinho
Ao Salvador o dizes com solicitude
Esperando o auxílio do seu poder divino.
Jesus parece a princípio rejeitar o pedido
“Mulher, que nos importa”, responde Ele, “a vós e a Mim?”
Mas no fundo do coração, chama-te sua Mãe
E o seu primeiro milagre, realiza-o por ti.
20. Num dia em que os pecadores escutam a doutrina
D’Aquele que deseja recebê-lo no Céu
Encontro-te com eles, Maria, na colina
Alguém diz a Jesus que tu querias vê-lo.
Então, o teu Divino Filho diante da multidão
Do seu amor por nós mostra a imensidade
Diz: “Quem é meu irmão e minha irmã e minha Mãe,
“Senão aquele que faz a minha vontade?”
21. Ó Virgem Imaculada, a mais terna das mães
Ao ouvir Jesus, não se entristeces
Mas alegras-te porque Ele nos faz compreender
Que a nossa alma se torna a sua família na terra
Sim, alegras-te por Ele nos dar a sua vida,
Os tesouros infinitos da sua divindade!…
Como não te amar, ó minha Mãe querida
Ao ver tanto amor e tanta humildade?
22. Amas-nos, Maria, como Jesus nos ama
E consentes por nós em afastar-te d’Ele.
Amar é tudo dar e dar-se a si mesmo
Quiseste demonstrá-lo ficando conosco.
O Salvador conhecia a tua ternura imensa
Sabia os segredos do teu coração maternal
Refúgio dos pecadores, é a ti que Ele nos deixa
Quando abandona a Cruz para nos esperar no Céu.
23. Maria, apareces-me no cimo do Calvário
De pé junto da Cruz, como um padre no altar
Oferecendo para desagravar a justiça do Pai
O teu Bem-amado Jesus, o doce Emanuel!…
Um profeta o disse, ó Mãe sofredora,
“Não há dor semelhante à tua dor!”
Ó Rainha dos Mártires, permanecendo exilada
Dás por nós o sangue todo do teu coração!
24. A casa de São João torna-se o teu último abrigo
O filho de Zebedeu terá de substituir Jesus…
É a última informação que dá o Evangelho
Da Rainha dos Céus não fala mais.
Mas o seu profundo silêncio, ó minha Mãe querida
Não revela por ventura que o Verbo Eterno
Quer Ele próprio canta os segredos da tua vida
Para gozo dos teus filhos, todos os Eleitos do Céu?
25. Em breve eu ouvirei esta doce harmonia
Em breve no Céu formoso eu irei ver-Te
Tu que vieste sorrir-me na manhã da minha vida
Vem sorrir-me de novo… Mãe… chegou a tarde!…
Já não temo o esplendor da tua glória suprema
Contigo eu sofri e desejo agora
Cantar nos teus joelhos, Maria, por que te amo
E repetir para sempre que sou tua filha!…
SONETOS E POEMAS DA MADRE MARIA JOSÉ DE JESUS
A Teresinha…
Soneto
Visão de Nossa Santa Madre Teresa de Jesus
Em lágrimas, goteja e rola a Ave-Maria
Do campanário… mais um pouco, e rende o alento
– Entre os braços da noite – o agonizante dia…
No teclado sutil das folhas, cala o vento.
Nas ogivas do claustro, entra a sombra erradia.
Eis de uma monja assoma o vulto pardacento,
Que vagarosa segue a alameda sombria.
– Tocam seus pés o chão, e o céu seu pensamento.
– Vai seguindo, porém ao subir uma escada,
Vê descer um menino, e interroga surpresa:
“Quem és tu, que violaste a clausura sagrada”?
– E tu quem és? – pergunta o infante com firmeza.
“Teresa de Jesus”, torna a monja admirada.
– Pois eu, o infante diz, sou Jesus de Teresa. –
Sítio!
Tenho sede de ti, meu doce Amado,
Sede de ver a tua formosura,
Sede de ter-te em mim sacramentado,
Sede de amor, de cruz e vida pura;
Sede de ver-te conhecido e honrado,
De ti trazer, Deus meu, toda criatura;
Sede do Céu, sede de dar-te agrado,
Sede de sede, e sede de fartura…
Tenho sede… mas ah! que nada acalma,
Nem tu, deus meu, pois, quando fartas a alma,
A sede aumenta a par da saciedade…
Não, não me fartes! Dá-me cada dia
Mais sede – dessa sede que inebria…
A fartura será na eternidade.
Caridade
Eu te amo, ó Deus…
Num lúgubre cenário,
Morres, Senhor, no altar sanguinolento
Da Cruz… E o homem revive – no momento
Em que por ele expiras no Calvário…
Eu te amo…
À luz do gótico santuário,
Um Padre Te ergue ao Céu no sacramento;
Dá-te aos fiéis em místico alimento,
E de novo Te encerra no sacrário…
Ó prodígios do amor mais fino e terno!
Ó voragem que chama outra voragem!
Porque me amas eu te amo, ó Deus eterno!
Sim, eu te amo…
Por Ti meu sangue corra!
Por teu amor, pelo homem – tua imagem –
Eu lide, eu pene, eu sofra, eu viva, eu morra!…
23/11/1920
Quem é Jesus, ou que é Jesus?
Quem é Jesus, ou que é Jesus? Deus Humanado,
É o sumo Bem, que em Si todos os bens encerra,
Forte e invicto Senhor, poderoso na guerra,
Meu invencível rei e meu Mestre adorado.
Quem é Jesus, ou que é Jesus? É o meu Amado,
O meu Tesouro, é tudo o que tenho na terra;
Meu Deus, a quem minha alma extática se aferra,
Qual náufrago que encontra o porto desejado.
Quem é Jesus, ou que é Jesus? É a Santidade,
A Bondade, a Beleza, a Suprema Verdade…
Jesus é a Luz do mundo, é o Cristo Redentor.
Quem é Jesus, ou que é Jesus? Oh! que alegria!
É o Filho Virginal de minha Mãe Maria:
É meu Irmão, é meu Esposo, é meu Amor…
Fevereiro – 1928
Á minha família do Carmelo
Ó minhas Irmãzinhas do Carmelo,
Fragrantes lírios de ideal brancura,
Em todas vós achei, nesta clausura,
De mães, de irmãs, de filhas o desvelo.
A vós me prende e prenderá sempre o elo
Do amor sem fim, da gratidão mais pura.
A vossa santidade e formosura
– Eis a minha ambição, meu grande anelo.
Temos o mesmo amor à Mãe celeste;
O mesmo amor a Deus; a mesma veste,
O mesmo Escapulário, o mesmo véu;
Unidas combatemos nas trincheiras…
Oh! como será doce, companheiras
Sermos eternamente lá no Céu!
Outubro – 1940
Itinerário
Por toda a eternidade eu como que dormia
No teu seio, ó meu Deus, na tua mente eterna;
Já tua providência, amorosa e paterna,
Minha vida, através dos séculos, previa.
Fizeste-me nascer filha da Igreja, um dia.
Na Mãe do Céu achei a Mãe mais doce e terna;
Tua lei me conduz; teu amor me governa,
E o Pão que me dá vida é a tua Eucaristia.
E, agora, torno a Ti, finda a minha carreira,
Regressarei ao Céu – a morada primeira,
Que será para sempre o meu eterno lar.
Ó Deus, que és Pai, e és Filho, e és Espírito Santo,
Se nesta vida, que é de exílio, eu te amei tanto,
Por toda a eternidade, oh! quanto te hei de amar!…
Madalenas
Junto da Cruz soluça a Madalena,
Louca de dor, ao ver o Mestre amado
Pagando – Ele o Impoluto, o Santo – a pena
Da iniqüidade humana, do pecado.
A seus olhos desfila, cena a cena,
O horror de seu tristíssimo passado;
E ela vê quanto é grave o que condena
O mesmo Deus a ser crucificado!…
Ó minha alma, como ela tu pecaste:
Como ela faze penitência agora.
Serás perdoada porque muito amaste.
Os pecados do mundo e os teus deplora!
Ama o teu Deus que tu crucificaste!
E, junto desta Cruz, definha e chora.
Poema Missus a Deo
No princípio criou Deus
O Céu e a terra
E, logo, seu ornato
E tudo o que neles se encerra:
O pálio do firmamento,
As montanhas gigantes,
As florestas e os vales,
As amenas colinas,
Os prados verdejantes;
O que nasce e o que vive,
O que se move e agita,
O que pensa e edifica,
O que é força, o que é luz.
E na terra e nos ares,
No amplo bojo dos mares,
A vida pululou,
E num concerto imenso,
Ao Deus que tudo fez do nada
Cada ser apregoou.
E tu, Padre bendito,
De certo modo és criador
Quando no altar consagras
O Corpo e Sangue do Senhor.
E o Verbo feito carne
Quis tua cooperação
Para aplicar às almas
O Sangue da Redenção,
Quando perdoas pecados,
Quando fazes comungar,
Quando o humano divinizas
No Calvário do altar,
Pelos teus dedos escorre
– Qual o vinho no lagar –
O Sangue que tudo paga,
A redimir, a salvar,
A restaurar o perdido,
A tudo santificar.
E assim és, Padre sublime,
Outro Cristo e Redentor:
Dás a graça, dás a vida,
Dás a salvação e o amor.
E o Espírito Santo
Se apodera de ti,
Todo o teu ser invade,
Todo te enche de Si.
Ó canal abençoado
De toda graça e todo bem,
Ó Sacerdote santo,
Tudo por ti nos vem.
As palavras que dizes
Não são tuas, são de Deus,
Os teus rasgos sobre-humanos
Não vem de ti – são seus.
– Tão pequeno e tão grande, –
Como Deus te quer bem!
Mais que a todos os homens
E que aos Anjos também!
És semelhante a Maria,
Tu que fazes cada dia,
Do Céu o Verbo descer!
– Ó manancial de santidade,
Familiar da Trindade,
Cume na escala do ser!
Por ti o Consolador consola,
Por ti derrama a sua unção;
Por ti ensina e dirige,
Por ti ao Céu nos guia,
– A tua ação é Sua ação.
Sim, Sacerdote divino,
Véu do espírito de Amor,
Tu que geras Deus nas almas,
És santificador.
Ah! prouvera a Deus que no chão
Já não pisassem mais teus pés;
E em fé da tua missão,
Para o mundo crer quem tu és,
De tua fronte jorrassem raios
– Como da fronte de Moisés.
1958.
O dia da Carmelita
Na calma da madrugada
Ouve-se uma matracada,
Depois outras, outras mais…
Levanta-te, ó Carmelita,
Olha quanta gente aflita
Nas prisões, nos hospitais…
Os missionários
Sobem ao altar;
Os operários
Vão acordar…
Dê-lhes coragem,
Dê-lhes vigor,
– Qual doce aragem –
O teu amor.
Vai ao coro antes da aurora,
Na oração suplica e chora
Para que o bem vença o mal;
E depois, no santo Ofício,
De ti faze o sacrifício
Mais inteiro, mais total.
Já as criancinhas
Se vão erguer…
Ah! pobrezinhas!
Que irão fazer?
Precisa a infância
De tanta luz…
Pede-a com ânsia,
Pede-a a Jesus.
Corre a haurir força e energia
Nas fontes da Eucaristia,
E depois deixa-a correr,
– Como tranqüila ribeira
Que refresque a terra inteira
Dando a todos de beber.
Entra nos lares,
Nos “ateliês”;
Transpõe os mares,
Ninguém te vê…
Cai – como orvalho –
Sobre as missões,
Sobre o trabalho
Das conversões.
Junto à Mãe do Céu bendita,
Dia e noite ora e medita
Na santa Lei do Senhor,
Para os ministros da Igreja
Serem fortes na peleja,
Em redor de seu pastor.
São sal da terra,
Do mundo luz;
Nada os aterra,
Sua arma é a Cruz.
Dá-lhes bravura
Na luta cruel,
Sendo mui pura,
Humilde e fiel.
Quantas almas consagradas
Vivem no mundo, ilibadas,
– Como lírios num paúl…
Voa a dar-lhes força e alento,
Percorrendo num momento
A terra, do norte ao sul.
-“ Anjos amados,
Lutai, sofrei,
Como soldados
De Cristo-Rei.
Vossa irmã pede
Por todas vós;
Roga e intercede…
Ah! não estais sós!”
Sempre imolada e serena,
Faze quanto a Regra ordena,
Sem nenhum temor servil;
Fez-te “Mãe” a Virgindade:
Ganha o pão à Humanidade,
Sobretudo ao teu Brasil…
Com Deus expande
Teu coração…
Oh! quanto é grande
Tua missão!
Tu representas,
Na Igreja, “o Amor”:
O mundo alentas
Com teu ardor.
Já bem tarde, em tua cela,
Com Maria, junto d’Ela,
Sob o seu materno olhar,
No duro leito adormece,
Que também teu sono é prece,
Teu dormir inda é amar…
E ao vir a morte,
Sublime, em paz,
Guerreira forte,
Não temerás.
– Ganha a vitória, –
Irás, veloz,
Inda na Glória,
Rogar por nós…
05/06/1931.
A nossa celinha
Ó minha cara celinha,
Minha prisão amorosa!
Quanto gozo, aqui sozinha,
Na tua paz deliciosa!
De ti subo ao Céu Empíreo,
E a Deus rogo em sua glória:
E trago a força ao martírio,
E trago à Igreja a vitória.
Percorro, depois, a terra;
Entro em todos os santuários,
E adora ao Deus que se encerra
Por nós em tantos sacrários.
Em ti oro, em ti medito,
Em ti sofro, em ti trabalho;
E alcanço o consolo ao aflito,
E à terra estéril o orvalho.
E em ti vou passando os dias,
Celinha de meus amores,
E vês minhas alegrias,
E vês também minhas dores…
E de ti – qual avezinha –
Subirei ao eterno gozo…
Adeus! Adeus, cela minha,
Que eu me vou com meu Esposo!…
Amor! Amor! Amor!
Quem, no gozo e na paz da eternidade,
Quem, dizei-me Vos fez, ó Deus Criador,
Chamar do nada ao ser a humanidade?
Amor! Amor! Amor!
Quem Vos fez, tendo Adão prevaricado,
A vinda prometer de um Salvador?
Como agora a meu Deus vejo humanado?
Amor! Amor! Amor!
Quem Vos gerou no seio sacrossanto
De Maria, e do inverno no rigor,
Num presépio Vos pôs, sofrendo tanto?
Amor! Amor! Amor!
Quem Vos Fez procurar trinta e três anos
A manada perdida, ó bom Pastor?
Ensinos quem nos deu tão soberanos?
Amor! Amor! Amor!
Quem – coberto de açoites e coroado
De espinhos – pôs na Cruz meu Redentor?
Quem? Os judeus? Pilatos? O pecado?
Amor! Amor! Amor!
Oh! quem deu – moribundo no madeiro –
A Mãe de Deus por mãe ao pecador?
Quem me deu seu tesouro derradeiro?
Amor! Amor! Amor!
Quem Vos prendeu, Jesus, na Eucaristia?
Quem escondeu numa hóstia o meu Senhor?
Quem Vos fez minha luz, minha alegria?
Amor! Amor!Amor!
Como sois nossa máxima recompensa
No Céu – findo o desterro do viajor?
Como, Deus meu, depois de tanta ofensa?
Amor! Amor! Amor!
Quem me fez vossa esposa, Carmelita?
Quem do mal me arrancou, meu Salvador?
Quem uma freira fez de uma maldita?
Amor! Amor! Amor!
Ah! de amor seja eu toda consumida,
Pois amor é meu Deus e meu Senhor.
Amor, seja amor toda a minha vida,
Amor! Amor! Amor!
Junho – 1913.
MIRIAM DE JESUS CRUCIFICADO
Parábolas de Cristo
A quem me compararei?
Aos passarinhos em seu ninho.
Se o pai e a mãe não lhes trouxerem comida
De fome morrerão.
Assim a minha alma sem vós, Senhor:
Sem sustento não podem viver.
A que me compararei!
Ao grãozinho de trigo
Lançado na terra.
Se não cair o orvalho,
Se o sol não à aquecer
A semente mofará.
Dando-me orvalho e sol
Esse grãozinho umedecido e aquecido
Deitará raízes,
Se tornará uma bela espiga
Repleta de grãos.
A que me compararei?
À rosa colhida que murcha na mão
Perdendo seu perfume,
Mas na roseira,
Ela conserva viço, beleza e odor.
Que eu permaneça em Vos
Para que eu tenha vida.
Com que vos pareceis, Senhor?
Com a pomba que alimenta os filhotes,
Com uma terna mãe
Alimentando o filhinho.
Salmo de Louvor
Chamei a terra inteira
Para te bendizer e servir,
Para sempre, sem fim,
Meu coração unido ao teu.
Convidei a imensidão do mar
Para te bendizer e servir,
Para sempre, sem fim.
Convoquei os passarinhos do ar
Para te bendizer e servir,
Para sempre, sem fim.
Chamei e convidei a Estrela Dalva
Para sempre, sem fim.
Ouço o meu Amado perto de mim, na frente,
Para sempre sem fim.
Rasga-te véu que o escondes
Quero ver o meu Amado,
Para adorá-lo e amar
Para sempre, sem fim,
De coração unido ao seu.
Chamei o homem ingrato, convidei-o para te bendizer,
Servir, louvar e amar,
Para sempre, sem fim!
Lamentações de Jô e Geremias
Enviai o vosso orvalho, Senhor,
A esta terra queimada e ressequida.
Minhas carnes se decompõem,
Não mais me sustentam os pés,
Nem mais se agitam as minhas mãos.
Enrijeceram os cabelos da cabeça
E se tornaram hirsutos,
Picando como agulhas.
Tapados têm os ouvidos
E de tão duros
Não ouço mais nada.
Minha vista está ardendo,
Não enxergo mais a luz.
Meu nariz está fechado
E minha língua grudada ao paladar
É incapaz de pronunciar uma palavra
Que clame por Vós.
Os dentes de tão serrados
Não deixam passar o ar
E sinto-me morrer.
Não consigo mexer
Os lábios ressequidos
Para pedir-vos socorro.
Fazei descer, Senhor, vosso orvalho
E a terra estéril voltará a viver!
Expressão da alma enamorada
A minha alma embevecida
Contempla vossas obras…
Quem pode vos louvar,
Ó Deus imenso?!
Minha alma se extasia,
Deus Poderoso!
Um nada, um grão de areia
Grita: vinde a mim!
Quem pode afirmar
Que o Poderoso olha?
O vosso olhar! Vós que me olhais,
Vinde a mim.
Só Vós, ó meu Deus,
Sois o meu Tudo.
Vos contento, bondade infinita,
Vejo vosso olhar maternal.
Vinde logo, sol de justiça,
Acordai.
A minha alma se consome,
Abatida pela espera. Vinde logo!
Ó minha alma, com asas de pomba
Voa para meu Deus e meu Tudo.
Vosso olhar me consola
E minha alma estremece.
O nada, o pó, estremece
Perante um Deus tão grande.
Ele veio visitar o seu campo,
Voa, minha alma.
Minha alma vos divisa na nuvem
E não quer mais ficar aqui.
Um olhar vosso é o bastante
Para me fazer sair.
O Senhor é esplendido em seu poder,
Tudo o louva, tudo o louva.
A minha alma endoidece,
Levai-a, não pode mais esperar.
Que teme a Deus, tudo possui.
A árvore da vida
Salve, salve, Árvore da Vida
Que o fruto da vida nos dais!
No meio desta terra,
Meu coração geme e suspira.
Quem me dera ter asas?
Voaria para junto do Amado.
Salve, salve, Árvore da Vida
Que o fruto da vida nos dais!
Em vossas folhas vejo escrito:
Nada temais!
O vosso verdor nos diz:
Esperai!
Os ramos dizem: caridade,
A sombra diz: humildade.
Salve, salve, Árvore da Vida.
Que o fruto da vida contém!
No meio desta terra,
Meu coração geme e suspira.
Quem me dera ter asas!
Para junto do Amado voaria.
Salve, salve, Árvore Bendita
Que os frutos da vida carregam.
À vossa sombra suspiro,
A vossos pés quero morrer.
Enaltecendo Maria
Aos pés de Maria,
A Mãe querida,
A vida encontrei.
Vós todos que sofreis, vinde a Maria,
A seus pés
A vida encontrei.
Tu que penas neste Mosteiro,
Maria conta teus passos e trabalho.
Diz a ti mesmo:
Aos pés de Maria
A vida encontrei.
Tu que moras neste Mosteiro,
Liberte das coisas terrestres,
A tua vida e salvação
Estão aos pés de Maria.
Moro nas entranhas de minha Mãe
E ali encontro meu Bem-Amado.
Seria uma orfãzinha?
No seio de Maria
A vida encontrei.
Não me chame de órfã
Maria é minha Mãe
E o meu pai é Deus.
A serpente, o dragão
Tentava-me morder
E me tirar a vida,
Mas aos pés de Maria
A vida encontrei.
Maria me chamou
E neste Mosteiro
Sempre ficarei:
Aos pés de Maria
A vida encontrei.
………………………
Fonte: Carmelo São José – Cruz Alta.
Observação: a série de poemas foi extraída da seção “POESIAS”, em sua íntegra, tendo sido publicada no site http://www.carmelosaojose.com.br/poesias.php .